Definitivamente, falar sobre viagens não é meu ponto forte. Isso fica muito claro quando me lembro da primeira vez em que fui fazer a cobertura de um desembarque no aeroporto – no caso, a seleção brasileira feminina de vôlei. Era final de tarde quando o Nara chegou e anunciou a minha pauta no dia seguinte. Juro que não foi intencional, mas devo ter feito uma cara de interrogação tão grande que ele não teve outra alternativa a não ser perguntar: “Vai dizer que você nunca foi em um aeroporto na sua vida?!”.
A resposta foi sincera: “Já… mas eu tinha cinco anos”. Ok, zoações a parte, o fato é que eu continuo sem ter entrado em um avião. Pelo menos, eu já não me perco mais (tanto) no aeroporto de Cumbica. O de Congonhas só conheço de ver da rua, o que nos atuais tempos pode até ser uma coisa boa. Na verdade, o lugar mais longíquio que cheguei na minha vida, tendo São Paulo como referência, é a pacata Brasília de Minas, 539 quilômetros distante de Belo Horizonte.
Quem me conhece, sabe que eu tenho o coração metade paulista e metade mineiro. Tenho família pelas bandas de lá e, por conta disso, costumo atravessar a divisa com uma certa frequência – sempre por meios terrestres. Trata-se de uma verdadeira aventura chegar em Bocaiuva, meu destino de todos os finais de ano e, com alguma sorte, o de julho também. São pouco mais de 1000 quilômetros em estradas que vão se degradando pouco a pouco.
Já fui tantas vezes para lá que poderia até fazer um guia, apesar de duvidar levemente da viabilidade comercial do projeto. O que eu tenho para indicar, então? Em primeiro lugar, o pastel de beira de estrada da Fernão Dias, em Itatiaiuçu, região metropolitana de BH. É o segundo melhor do Brasil (o primeiro é em São Bernardo, para onde viajo todos os dias) e conta com um dono absolutamente mal humorado. Só serve para comer na hora: nem tente comprar só a massa porque é impossível repeti-lo em casa. Ah, sim, e quando se pede Coca Cola com gelo e limão, você recebe seu refrigerante com metade da fruta dentro.
Claro, também não posso deixar de alertar sobre o quão confusa é Belo Horizonte, um lugar onde as placas só aparecem em cima das saídas. É a partir mais ou menos de lá que você vai começar a se sentir realmente em Minas, pois até então em 90% das cidades existem mais palmeirenses, flamenguistas e corinthianos que atleticanos ou cruzeirenses. No entanto, o sotaque mineiro, uai, pode ser ouvido desde o primeiro momento que você passa a plaquinha “SP-MG”. Inacreditável.
Também pode ser útil para alguém saber que Sete Lagoas, a terra do Zacarias, tem na verdade somente seis lagoas (me disseram que uma secou, mas confesso que eu preciso apurar melhor os fatos). E já que é para acabar com ilusões de vez, revelo que Montes Claros é uma cidade praticamente plana. Os tais “montes” foram degradados por uma fábrica de cimento. Logo, não são mais claros.
De Sete (ou seis) Lagoas para frente, com umas oito horas de viagem, começa o verdadeiro rali, com buracos cheios de estradas e pista “vai e vem”. Para piorar, mineiro dirige tão mal quanto paulista, só que costuma ser mais maluco na estrada porque acha que já conhece toda a rodovia. Entrando na BR-135, última estrada para Bocaiuva, logo se chega em Augusto de Lima, um lugarzinho no meio do nada cuja maior atração é uma placa que indica aos possíveis empresários que a cidade tem “Farta mão de obra”, o que também pode ser traduzido como “Alto índice de desemprego”. Alguns quilômetros mais tarde, passa-se por Engenheiro Dolabela, onde chama a atenção uma chaminé semelhante aquelas perto do Palestra Itália – sim, os Matarazzo estiveram por lá também!
A esta altura do campeonato você já vai estar acostumado com o cheiro de pequi. Assim como o pimentão, pequi é uma prova de que Deus não é perfeito. Trata-se, na verdade, da melhor forma dos norte-mineiros sacanearem quem é de fora. É um fruto que se assemelha com um abacate, mas só se rói o caroço, que antes deve ser cozido, o que o deixa com um aspecto amarelo e um cheiro não muito agradável. Se você for besta de morder o caroço, vai passar o resto de sua vida com espinhos na boca. Um dos grandes mistérios da humanidade é saber como o povo adora isso por lá.
Para finalizar, duas dicas imprescindíveis: no Norte de Minas chamar uma mulher de “vaca” não significa nada. Por outro lado, chame alguém de “moleque” e você será expulso da cidade, assim como se referir a uma senhora como “rapariga”. E, como não poderia deixar de ser, pao de queijo é muito barato: não aceite pagar mais que 0,30 centavos a unidade (sim, porque em Bocaiuva quase nada tem preço – o valor dos produtos varia de acordo com a cara do consumidor).
Enquanto Marmota continua morrendo de vontade de conhecer Minas Gerais, a série Colônia de Férias apresenta textos gentilmente preparados por seus ex-colegas de trabalho, mas que permanecerão amigos.
Nossa, só dá Minas Gerais nessa Colônia de Férias… Ainda bem. 😉
Minha terra é tudibom messss… e eu quase babei ao ler o pequi ali.. senti até o cheiro bom.. nhammm…
beijo
O norte de Minas é a região que tem mais pequizeiro no mundo. O pequizeiro é uma árvore típica do cerrado. A vegetação típica do norte de Minas é o cerrado. Entretanto, quando você chega no norte de minas, não sente nenhum cheiro de pequi. Na verdade, você só sente o cheiro do pequi na hora do almoço (o arroz com pequi) ou nos mercados municipais, onde é comercializado. Morei lá 18 anos e só sentí o cheiro de pequi nessas duas situações. Ainda, entre novembro e março os moradores colhem a fruta do pequizeiro. Sete Lagoas tem sete lagoas. São elas: Lagoa Paulino, Boa Vista, José Félix, Cercadinho, Matadouro, Catarina e Chácara (essa fica boa parte do ano seca, como você mostrou no seu post). Augusto de Lima realmente é uma cidade muito pobre, como é o norte de Minas em geral. Montes Claros tem mais “morro” do que se imagina, na cidade e nos seus arredores. Talvez você deve ter passado somente no anel rodoviário, e não frequentou bairros como o morro do Frade e o Morrinhos. Nem o novo Ibituruna. Evidentemente que a topografia da cidade não é acentuada como Belo Horizonte, ou até mesmo Sete Lagoas, mas uma coisa posso te dar uma certeza, Montes Claros tá muito longe de ser uma cidade plana. E o grupo cimenteiro Lafarge realmente tá explorando o morro dos Dois Irmãos, um dos cartões postais da cidade. Mas não dá pra comparar o morro dos dois irmãos com o conjunto de montanhas que cerca a cidade. É igual comparar sua presença física (seu tamanho) e a região central de São Paulo. Melhorando, os “montes” estão mais claros do que nunca. Para finalizar, Bocaiúva tem acento. E é bem no “u”. Seu texto é excelente, pois mostra claramente o conhecimento que o paulista tem do Norte de Minas. Parabéns!
Essa Colônia de Férias está boa demais! Quer dizer que até a melhor blogueira do Brasil deu seus pitacos por aqui? 🙂
Parabéns ao André e beijos na Carol. E que vontade de conhecer Minas, uai!
Carolina Maria…
Tô aqui de boca aberta,pois minhas lembranças de infãncia passam por Pires de Albuquerque e bocaiuva,onde ainda mora parte da familia de minha mãe…
adorei o texto!!!!
uai,menina,cumé que vc esta aqui, e a gente nem sabia? vou correndo conhecer seu blog,por que afinal, mineiros não são solidarios só no cancer…rssss
“Minas é bão demais, sô”
heheheh
E também nunca andei de avião!
=)
Oi Rodrigo!
Em primeiro lugar, quero pedir desculpas se lhe ofendi de alguma forma. Na verdade, procurei fazer um pouco de humor com o caminho que faço pelo menos uma vez por ano, o que implica em “exagerar” algumas coisas, como o cheiro do pequi.
Na verdade, eu adoro mesmo de paixão o norte de Minas, mas não suporto pequi e creio que nem se tivesse passado a minha vida inteira lá, eu suportaria. De fato, eu conheço bem pouco mesmo de Montes Claros, provavelmente somente a parte plana mesmo. Faltou eu falar que lá também faz um calor enorme, bem mais que Bocaiúva (com acento bem no “u” – obrigado pela dica gramatical que não me lembrei ao escrever durante a madrugada).
Quanto a Augusto de Lima e à pobreza da região, realmente é uma coisa que me entristece e mais triste ainda é ver os governantes colocarem somente uma placa para resolver isso.
Enfim, espero de verdade que você não tenha se ofendido, até porque adoro aquele lugar. E, assim como adoro SP, tiro muito sarro dos lugares que eu gosto, é da minha natureza.
Que coisa mais feia, desmistificar Minas Gerais desse jeito, huahuahua! XD Muito bom o post e sensacionais as informações. Coisa de bastidores mesmo, pra quem é de fora, como eu!
Preciso me lembrar desse truque do pequi, que parece ser algo que eu cairia, com certeza.