Vem aí o flash-pagode

Quando puder, faça essa experiência eletromagnética: siga pelo Alto Tietê, entre as cidades de Itaquá, Poá, Suzano e Mogi das Cruzes, e tente sintonizar outra emissora que não seja a Transcontinental. A torre dessa prestigiada FM, especialista em samba-pagode-genéricos e que pode ser ouvida em toda a Grande São Paulo, fica exatamente nessa região. Em tese, daria pra ouvir a rádio por ali até usando batedeira ou liquidificador.

Dias atrás fiz esse trajeto e, por falta de opção, lá vamos nós nos 104.7. Surpresa: a música não era uma completa desconhecida, dessas que você não consegue identificar a bandinha. Era um sucesso do Molejão, verdadeira coqueluche dos anos 90, época em que obrigatoriamente ouvia pagodinhos bacanas pra tentar (em vão) me aproximar das gatinhas. Chama-se Pensamento Verde, o que não quer dizer que trata-se de uma ode à ecologia.

Esta é uma história de uma garota nova
Que sem nada na cabeça
Quanto mais em sua cachola
Anda dizendo por aí
Eu sou a tal

Tem um pensamento verde
Seu presente não dá futuro
O seu papo é furado
Seus amigos são grilados
Mas assim mesmo ela afirma
Eu sou a tal (menina louca)

Ela chega com seu andar cansado desajeitado
Querendo saber se alguém a procurou
A turma logo responde ela fica empolgada
Sabe quem perguntou por você
Sabe quem perguntou por você
Sabe quem perguntou por você
Ninguém

Entusiasmado com esse momentâneo resgate ao passado, segurei a vontade inicial de desligar o rádio e passei para a próxima. Logo reconheci os acordes: era mais uma música amansa-pé-na-bunda. Veio o vocalista com aquelas tocantes palavras de conforto: “já tentei tirar você do coração, desisti… não consegui… que é que eu vou fazer, gosto de você…”. Finalmente o refrão, um pouco mais difícil de lembrar: “meu amooooor, te quero do meu lado… meu amooooor… estou apaixonado…”.

Juro que procurei pela letra exata dessa canção, até pra lembrar qual grupo raça, negritude, balanço, terra, sensação, revelação… Enfim, quem cantava isso. Desisti ao colocar todas essas palavrinhas no completíssimo site de letras do Terra e dar de cara com a mensagem “sua busca retornou muitos resultados, por favor seja mais específico”. Frase que sintetiza como poucas a essência do pagode.

Concordo que esse é um gênero musical bastante discutível, onde o número incessante de “novos artistas” não passam de aproveitadores da modinha, e acabam nivelando letras, melodias e afins bem por baixo. Mas independente dessa postura, tenho que admitir: muitas dessas canções provocam efeito, digamos, parecido ao de outros resgates nostálgicos.

Começou com a Trash 80´s e sua equivalente carioca Ploc 80´s. Em São Paulo, a 97 FM avança mais uma década e resgata, toda manhã, no programa Energia na Véia, uma porção daquelas musiquinhas poperô que empesteavam os primeiros volumes dos CDs “As 7 melhores” e equivalentes.

Diante do processo inevitável, eu me arrisco a dizer que, em pouco tempo, vai ter algum espertinho faturando em cima do conceito “flash-pagode”. Quem se interessar, pode desenvolver suas idéias sem citar o meu nome, tá?

(Postado em 13/05/2006)

Comentários em blogs: ainda existem? (14)

  1. Pôxa, esse tipo de resgate é muito interessante. Há uns anos, num momento de “sacocheiísse”, eu a Sil e meu irmão Tubaína começamos a resgatar essas pérolas pagodeiras da memória. Rimos muito!!

    Outro exercício interessante e ouvir pagodes novos ou desconhecidos e, ao ouvir pale primeira vez a música, tentar advinhar a rima da próxima estrofe.

    Divertidíssimo!!!

    Um abraço!

  2. Ô loco… e teve uma época em que eu gostava disso. Achava que era uma versão moderna de samba. E tinha uma época que tocavam pagode até em locais da moda aqui em Brasília, como um barzinho chamado Galeria, point no início dos anos 90.

  3. “época em que obrigatoriamente ouvia pagodinhos bacanas pra tentar (em vão) me aproximar das gatinhas”

    André, vc acaba de incinerar o seu filme num calor de 1000º.

  4. Credo pagode ja teve sua época, lembro q todo dia na TV tinha um grupo de pagode com 1 cantor e 100 dançarinos. E axava que aquela música naum era do molejo, pra nossa sorte passou a febre do pagode entrou a febre do FUNK ngm merece
    Abraço

  5. E já começou. Hoje mesmo no Faustão veio o Razão Brasileira (que cantavam “O amor faz a gente enlouquecer / faz a gente dizer coisas pra depois se arrepender…” e tinham uma peculiar dancinha). Isso sim que é roots. Viva o flash-pagode!

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