Nova carta (romântica) do Papai Noel

Já está enchendo o saco. Em 2003, fui surpreendido por uma mensagem do Papai Noel, explicando meu complicado segundo semestre. Ano passado, o velho batuta mandou outro e-mail, desta vez para explicar um curioso cartão prateado em japonês. Esse ano o bonachão barbudo despirocou. Aproveitou sua experiência em seu mundo distante e abstrato para falar de… amor. Mas que gordo metido!

— original message —
From: Papai Noel <santaclaus@laponia.gov>
Fecha: 26/12/2005 12:34:56
To: André Marmota <uma@igualaquinzequilos.com>
Subject: Feliz Natal

Ho ho ho! Mais uma vez, um feliz Natal para você, meu jovem redator de coração duro!

Definitivamente, estou a cada ano mais impressionado com a falta de sensibilidade humana. Digo isso pela quantidade de cartas cada vez menor… E quando aparecem, são puramente materialistas. Querem dinheiro, ou qualquer coisa que lembre esse monte de papel sujo que enlouquece os homens. Felizmente, o mundo está cheio de gente feliz, com pedidos mais humanos. Como o seu, no ano passado, estampado naquele seu site bacana: “Papai Noel, o de sempre: uma namorada”. Lembra disso?

Ahhhh, meu jovem… São pedidos assim que ainda motivam esse pobre velho cansado durante o ano. Sim, porque a fábrica de brinquedos já está terceirizada: meu envolvimento é puramente logístico e limitado às últimas semanas do ano. No resto do tempo, saio em busca desses bens intangíveis. Especialmente para os bons meninos, que cuidam bem dos presentes. Ou aqueles que insistem no mesmo pedido anos a fio, como você.

Ora, ora. Tratei de rodar o mundo em busca de um par para ti. Percorri terra e ar, mas foi do mar que ela surgiu. Com um brilho radiante nos olhos, muita dedicação e determinação… Muitas qualidades, e uma pitada dessa coisa inexplicável, uma das poucas que emerge da terra dos sonhos e ainda vinga em alguns cantos desse mundo cão: essa coisa chamada amor.

Naquele instante, meu nobre redator de coração duro, ignorei seus conceitos e me alimentei de tudo quanto foi metafísico e tresloucado. Nesse ambiente, qualquer definição é válida. Amor é um sorriso espontâneo e sincero. Amor é banho de chuva com direito a arco-íris no horizonte. Amor é magia radiante saltando de uma imensa cartola. Amor é serenata e coral de vozes na janela. Amor é bolo de cenoura com cobertura de chocolate. Amor é bola de neve rolando morro abaixo. Amor é uma geladeira carregada de keep cooler. Amor é paixão, tesão, fricção, tensão, emoção, fixação, sabão, melão, feijão… Qualquer coisa que mexa com os seus sentidos.

Parece o presente perfeito, não é mesmo? É, meu rapaz, eu sei. Errei no pacote. Exagerei na dosagem. Mandei entregar o tal do amor e acabou vindo tudo aquilo que muitas vezes é intercambiável, mas pode causar efeitos colaterais imprevisíveis e alucinógenos. Transforma pessoas normais e equilibradas em seres obcecados, que se agarram em fetiches, acreditam na paradoxal alegria do sofrimento, tornam-se viciadas em algo que deveria provocar prazer ou alívio, mas que acaba em uma irreconhecível destruição.

Pois então, aí vem você me dizer: Papai Noel, não dá para chamar isso de amor. Ora, seu escrivinhador teimoso de coração duro… Não há uma definição clara sobre o que é esse tal de amor, e nunca vai existir. A humanidade tola pode reunir toda sorte de sociólogos, filósofos, poetas e afins, e nenhum deles vai conseguir explicar, impedir ou controlar seus semelhantes a amar sem pensar. A sofrer diante da necessidade de amar demais mas criar esse desequilíbrio que tanto incomoda você. Ou pior: amar alguém que não lhe corresponde.

A limitação do homem jamais vai interpretar esse sentimento – que, como te disse, pode ser qualquer coisa. Amor é uma estaca encravada no coração. Amor é uma boneca de porcelana que jogaram na sua mão, ou centenas de pratos sobre estacas finas na sua frente, e você não pode deixá-los cair. Amor é um buraco aberto de qualquer jeito no tempo e no espaço. Amor é triste, verdadeiro, de intensidade variável e constantemente reciclado. Amor é gripe, que deixa o enfermo numa longa quarentena e, meses depois, volta com toda força mesmo depois do tratamento.

Acho que você já entendeu: poderia ficar muito mais tempo tentando amolecer você, mas enfim. Não vai adiantar nada. Você é mais teimoso que a mais obstinada das mulheres apaixonadas, e acredito ter entendido a sua definição pura e simples da palavra. Amor é um substantivo abstrato que indica a ação embutida no verbo amar, cuja única conjugação possível é a primeira pessoa do plural no futuro do presente.

Estou certo? Bom, resumidamente, você só vai conviver em paz com alguém que preencha aqueles seus pré-requisitos básicos – morar perto, não ser de aquário, essas coisas – mas que, fundamentalmente, não siga ao pé da letra o que diz seu coração. Alguém que tenha prudência, racionalidade, tempo e paciência para imaginar situações como “nós iremos”, “nós faremos”, “nós decidiremos”, entre outros, sem que isso provoque náuseas ou ferimentos. Tudo bem, meu caro. Mantenha a sua definição e faça feliz a mulher que, do jeito dela, vai entender e respeitar isso em ti.

Enfim, para te tranquilizar nessa virada do ano: aquele pacote que você devolveu com tristeza já foi reciclado e enviado para outro destinatário. Sem grandes modificações: é o mesmo amor cego e entusiasmado, de corpo e alma, sem muitos limites… Tudo aquilo que você já se cansou outrora, mas que ainda deixa muitas crianças felizes.

Não é espetacular? Em um ano cheio de encontros tempestuosos, seu fim virá com uma brisa suave para todos! Tenho certeza de que você vai comemorar a permanência da felicidade, independente daquilo que você chama de amor! Mas não vá desdenhar, espalhando por aí que “já viu esse filme antes”. Nunca subestime o poder do destino: sua companhia perfeita pode viver do outro lado do mundo, mas também pode ser aquela que está há anos na frente do seu nariz!

E, para não perder o costume, feliz fim de Natal! Ho ho ho!

Papai Noel
http://www.northpole.com

Comentários em blogs: ainda existem? (10)

  1. É o mesmo bom e velho André de sempre… A certa altura do texto, achei até que fosse rever Anadiômena!
    Um beijo grande, André!
    E que Papai Noel te mande um presente “do seu número” para te acompanhar em 2006!

  2. Papai Noel sempre sabe das coisas né?

    Andrezito! Que em 2006 a gente possa se conhecer e dar risadas da sua rabugentisse! 🙂

    Gosto de você! Beijos!

  3. rsrsrsrss

    eu tbn queria que o papai noel me dess um amor de presente, :'(
    que não me fizesse sofrer ou coisas do tipo,
    mas ano passado nem ganhei presente,
    acho qe fui uma má menina ;/

  4. Papai Noel eu sei que nao to sendo muito educada neses dias e só levo surra tento ser educada mas não consigo eu sei que Papai Noel não tem sait nem conputador mas quem tiver vendo a minha mensage vai saber que eu não queria ter irmã mais velha porque ela só me bate eu quiria ter 16 anos mas só tenho 10 e minha irmã tem 15

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