Apesar da capacidade de armazenamento cada vez maior dos dispositivos digitais, é praticamente impossível resumir tudo que aconteceu de mais importante em nossa vida usando ferramentas como um blog. Mais improvável seria registrar uma vida inteira, ao lado das outras vidas correlatas – afinal, somos pontos infinitos de uma complexa rede, conectados pela história. Como sou um apaixonado pelo passado, acho isso lamentável…
Em 1988, às vésperas dos Jogos de Seul, sequer pensava em ser jornalista. Mas um gibi da turma do Tio Patinhas aguçou ainda mais essa minha vontade de preservar os detalhes do dia-a-dia. Na trama, o velho pato sovina descobriu um estranho pó azul. Eram na verdade pedaços de cristal com uma interessante propriedade: tudo que era exposto ao pozinho avançava no tempo. A tal substância era usada apenas para curar ferimentos – ao espalhar o negócio pela área machucada, era como se aquela região do corpo estivesse alguns dias a frente, ou seja, cicatrizando. Um verdadeiro atentado às leis da física…
Pois bem, o pato, também conhecido por Uncle Scrooge, descobriu esta preciosidade, e tratou de criar uma lente intercambiável com esse cristal. Dessa forma, Patinhas acabara de inventar uma maquininha do tempo, capaz de enxergar os fatos antes mesmo de acontecerem! No gibi, o pão-duro lazarento só queria antecipar as transmissões olímpicas e ganhar uma bela grana. Evidentemente, a idéia do Patinhas não deu certo, e ele teve que arcar com alguns prejuízos.
Mas voltando. Imagine se pudéssemos ter uma câmera dessas, mas com a polarização invertida? Quer dizer, seríamos capazes de filmar histórias passadas. Mesmo aquelas que nos dá vontade de mudar o final… Aliás, estas dariam ótimos vídeos de auto-ajuda. Nem era preciso uma lente como a do velho Patinhas. Poderia ser um apetrecho separado, equipado com o capacitor de fluxo do Dr. Emmet Brown, aquele do Back to the Future, por exemplo. Você ajusta a data, hora, local, luz, câmera e ação!
Essa maquininha do tempo é, sem sombra de dúvidas, o presente dos meus sonhos. Com ela, poderia perfeitamente montar uma retrospectiva da minha vida uma forma bem mais interessante. Imagine como seria esse ano de 2002, por exemplo: trechos das minhas viagens de final de ano, lances de boliche, piadas semânticas e outros acontecimentos da redação, aqueles encontros inesquecíveis com os Nerds, seja pescando em Itaquá no Carnaval ou em nosso bate-papo no McDonalds da Henrique Shaumann. Todos os encontros insanos promovidos pelos meus amigos Estúpidos para trocar figurinhas da Copa. Ou os da galera do Noisnacásper, como aquela festa anos 70 da Lu. Ou as frequentes noitadas no “Alemão” com os amigos da Gazeta. Cenas impagáveis da reta final do meu curso de pós-graduação, aquela participação em uma rádio pirata em Poá. O encontro com a Bia em Campinas, com a Márcia no Rio, com as argentinas em Buenos Aires, com os amigos na festa de aniversário. As madrugadas da Copa. O casamento do Marcus, o da Karla, o da Lenice, o do Othon. Viagem para Bertioga, festa da Nikki, encontro com as empadas. No fim, a viagem para Aparecida e a expectativa para mais uma viagem de fim de ano.
Num futuro distante, daria até para fazer a MTV – Marmota Television, uma espécie de “show de Truman” retroativo. Viagens, temporadas escolares, festas inesquecíveis, as alegrias, as decepções… Um acervo que já existe, mais ou menos, na minha memória e em algumas frases desconexas, seria preservado eternamente.
Bem que o desenvolvimento tecnológico poderia acompanhar a imaginação do homem. Se bem que, às vezes, é melhor não…
(Postado em 25/12/2002)
Hahahaha! Que engraçado!… Adorei! 😉
Post antigo, mas interessante. Republicá-lo não seria uma espécie de retorno ao passado similar ao permitido pela máquina do tempo? 🙂 (será que fotos, textos e vídeos não seriam pequenas e reprodutíveis máquinas do tempo?)
Uma máquina do tempo que viajasse apenas ao passado foi o tema da minha nano novel do ano passado. O texto ficou horrivel, mas cheguei a algumas conclusões do tipo…. será que a gente aproveitaria bem todos os momentos da vida sabendo que é possivel voltar atrás para revivê-los? E, no caso de aproveitar menos, será que teríamos vontade de voltar atrás?
Eu com certeza ia gostar mais de assistir ao passado dos outros do que ao meu!