Lost e a narrativa transmidiática de Henry Jenkins

Sem levarmos em conta um certo país da América do Sul, onde a maioria da polulação passou a terça-feira preocupada com um reality show, outros rincões do planeta alimentaram a expectativa para o início da sexta e última temporada da série Lost. Confesso que assisti a alguns episódios no início, e a única conclusão que cheguei na época foi: “será como a boa e velha piada do Chu: muito desenvolvimento para um final sem molho”.

Talvez eu esteja errado – os fãs certamente me crucificarão. Mas há algo na série que precisa ser lembrado por qualquer profissional de comunicação. É o que Henry Jenkins define, no livro “Cultura da Convergência”, de “narrativa transmidiática”.

Independente do termo, é fácil entender – a revista Superinteressante inclusive já dedicou uma capa, há três anos, ao efeito provocado por Lost (texto do Tiago Cordeiro). O programa, que pode ser encarado como uma série limitada à TV, se transformou graças à web. E não me refiro apenas aos milhões de fãs buscando as melhores opções de streaming ao vivo, ou aos abnegados que passam madrugadas traduzindo episódios, redigindo legendas e, simultaneamente, encapsulando gravações em codecs para download.

No caso de Lost, há uma gama quase infinita de opções. Algumas delas criadas pela própria rede norte-americana ABC: produção de mini-episódios próprios para plataformas mobile sites “oficiais” da iniciativa Dharma e da empresa aérea Oceanic são os exemplos mais simples. Há ainda as iniciativas dos próprios usuários – como a Lostpedia, que conta com os espectadores para preencher as infinitas lacunas deixadas pelos sobreviventes perdidos numa estranha ilha.

Pode ser que você nunca tenha visto Lost – mesmo quando a Globo exibe, tratando de revelar detalhes da história antes de exibir os episódios. Mas está cada vez mais difícil pensar em produtos voltados ao entretenimento sem esquecer as múltiplas pontas possíveis, dentro e fora da web. Isso quando não vem à cabeça outra pergunta: será que isso cabe em produtos jornalísticos?

Atualizado: Nesta sexta-feira, o especialista no tema Jeff Gomez deu uma palestra sobre o tema – quer dizer, sobre “transmedia storytelling”… – na Rede Globo. Basicamente, reforçou o conceito, contando sua experiência com o filme Avatar: “mensagens, conceitos, para uma audiência em massa, para usuários de múltiplas plataformas. A história está no meio, as plataformas estão em volta e tudo vai para o público. É mais do que uma plataforma cruzada, é desenvolver a história. Com a transmídia, a história pode ir para a internet e a audiência começar a comunicar de volta”. Mais aqui.

Comentários em blogs: ainda existem? (2)

  1. Marmota,

    A profª Suzana Kilpp do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos (decana da linha de pesquisa sobre audiovisual) considera que LOST possui a narrativa de um GAME.

    Nisso, concordo com ela: pensa no Final Fantasy, por exemplo. Desafios, inimigos, fases, diferentes níveis de dificuldade e, a cada superação, o caminho pode ir para a frente ou para a trás, seja de maneira contínua ou descontínua.

    E, ao contrário de uma sequência de filmes, de um seriado ou de uma novela, é FUNDAMENTAL assistir a todos os espisódios para que o espectador possa situar-se na trama. Já o roteiro de uma novela é concebido para ser facilmente compreendido até por quem só pode assisti-la de 10 em 10 dias.

    A narrativa de um game aliada ao consumismo pressupõe que a maior fatia da remuneração não se deve nem à assinatura dos canais que transmitem Lost, nem à compra de DVDs: a Cauda Longa mostra que o que mais vende em Lost são os episódios online via iTunes Store e a ampla gama de quinquilharias e cacarecos para colecionador.

    É aí que entra o Jenkins: blogs, twitter, site da emissora e entrevistas do diretores e do elenco de Lost multiplicam muito mais a vendagem dos produtos dessa cultura de nicho do que a própria exposição massiva do produto.

    Digo mais: Lost é um seriado que, infelizmente, não é facilmente compreendido por migrantes digitais. A condição de compreender essa narrativa multimídia e atemporal remete à uma intimidade que somente a prática do uso dos hyperlinks e do trabalho com mais de uma janela do browser ou mais de um aplicativo aberto ao mesmo tempo podem proporcionar.

    []’s,
    Hélio

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