FSM: impressões de quem esteve lá

Enquanto o folgado aqui curtia férias em Florianópolis, milhares de jovens viajaram mais uns 400 quilômetros ao sul em função de um ideal: o terceiro Fórum Social Mundial reuniu pessoas do mundo inteiro em Porto Alegre, dispostas a pensar em alternativas aos efeitos nocivos da globalização – isso tudo enquanto outros pensavam exatamente o contrário durante o Fórum Econômico Mundial.

Coincidentemente, os caminhos de alguns destes jovens cruzaram com o meu no posto Petropen, em Registro, durante o almoço na última terça-feira. Na primeira matéria do Jornal Hoje, sobre um protesto na noite anterior, alguns dos presentes se sentiram aborrecidos. “É isso que a Globo mostra sobre o Fórum”. Em seguida, uma reportagem mais amena, sobre a dor da despedida, acalmou os ânimos dos viajantes, amarrotados após doze horas de estrada.

Seria injusto de minha parte fazer comentários sobre o Fórum Social Mundial, pouco vi a respeito enquanto descansava na Ilha da Magia. Por isso pedi ajuda a minha querida amiga e conterrânea Lediane Tassi. Ela participou do Fórum e fez um rápido apanhado de tudo que viu por lá. Confira:

– Porto Alegre nunca esteve tão diferente. Isso não significa dizer que estivesse melhor ou pior, isso veremos apenas com o passar do tempo, em conseqüência direta do pós-fórum. Mas naquele instante, era um diferente realmente diferente de todas as diferenças. Uma miscelânea de roupas, cores, aromas (alguns, pasmem, alucinógenos), culturas e idiomas.

– Uma cena linda: uma montoeira de gente no campus da PUC, no meio de outra mais dispersa – sim porque eram milhares de pessoas circulando, me chamou a atenção. Vi um grupo montando a pose para uma foto, cena que seria comum não fosse a peculiaridade da etnia: era um rabino, uma muçulmana, um libanês, uma indiana e um africano, todos vestidos conforme o local de origem. De arrepiar! Todos abraçados para sairem na foto. A toupeira aqui, sem nenhuma câmera para registrar o momento…

– Dá para imaginar uma roda de capoeira onde o capoeirista é um negro pilchado, isto é, vestido à caráter como gaúcho (com direito a bombacha, lenço e um chapelão na cabeça), em que o jogo se dava em “slow motion”? Eram movimentos de capoeira leeeeentos (propositalmente), inclusive com algumas seqüências engraçadas, meio de sacanagem. De repente, as palmas e o som do berimbau foram interrompidos por um rufar de tambores, atenção desviada. Tudo parou para ver de onde vinha o som. Era um grupo (acredito de brasileiros) que começaram a tocar um ritmo forte e contagiante com seus tambores, atabaques e tamborins. As batidas soavam misturadas ao som dos chocalhos! Ninguém conseguia ficar parado. E assim estava o campus da PUC…

– Dei uma passadinha no acampamento no último dia: era um mar de barraquinhas iglu coloridas. Oficialmente, cerca de 100 mil estavam acampados lá. Eu, com meus botões, duvido: acho que tinha muito mais, até porque 100 mil eram os cadastrados, não contavam os “inquilinos”, né?

– Segundo os acampados no Parque da Harmonia, nem tudo fora em prol do social: houveram vários furtos, além de cenas cômicas. Como a de um fulano que passeava perto do pessoal de Rio Grande com uma roupa de mulher embaixo do braço. Um colega meu, especialista em uma dessas artes marciais japonesas, estava louquinho para mostrar seus dotes – ainda mais depois de alguns litros de álcool na corrente sanguínea. Ele abordou o transeunte, deu uma gravata e o imobilizou. O coitado esperneava e gritava: “só não tira o meu cheirinho!”. Quando o meu colega olhou, reparou que o “cheirinho” era um copinho com cola de sapateiro. Já não sabia mais quem estava mais fora de si…

– As fábricas de calçados entrariam em falência se a moda do Fórum pegasse. No shoes. Dentro dos acampamentos, o pessoal andava descalço em meio a poeira. Nas oficinas e palestras, na primeira oportunidade os chinelinhos (preferência de nove entre dez bicho-grilo) eram deixados de lado. Ainda bem que foram disponibilizados uns quantos chuveiros públicos para o pessoal tirar o cascão (pelo menos no acampamento).

– “… E seja o que Deus quiser”. foi o que disse uma Advogada, doutora em Direito Internacional, numa oficina do sábado, dia 26, no Campus PUCRS, ao referir-se a um ataque norte americano ao Iraque, caso a ONU não consiga contornar a situação. Estremeci.

– “… A guerra na África não é uma guerra religiosa ou de etnia como dizem alguns, é uma guerra política e de interesses internacionais”, frase do fotógrafo Sabastião Salgado, também no sábado.

– Aplausos para as cubanas que aprenderam a comer comida chinesa de pauzinhos. Estávamos jantando no restaurante Muralha da China (pit stop obrigatório quando estou em POA) e algumas cubanas sentaram ao nosso lado. Gostaram de nos ver comendo de “hashi”, pediram uns ao garçom e, depois de muitas tentativas frustradas, já estavam comendo até milho verde e arroz com as estaquinhas. Uma beleza.

– O Quiquito de Ouro (sim, pois foi aqui no sul) para a pior cena aconteceu no último dia de Fórum, com a passeata na avenida Beira Rio, em que alguns acalorados resolveram protestar mostrando o “corpicho”, como vieram ao mundo. Nuzinhos da silva, os manifestantes foram barrados pela polícia à cavalo – alias, naquela hora não deu para distinguir quem era o homem e quem era o cavalo, devido a selvageria do ato. Pena que eu acompanhei a cena apenas pela TV e obviamente nem deu para ver muita coisa. Sinceramente deveriam ter feito vista grossa e fazer de conta que estamos em Amsterdã.

Já ficou com vontade de embarcar para a Índia, local do FSM em 2003 2004? (ainda estou em 2002, vide o meu talão de cheques…).

André Marmota tem uma incrível habilidade: transforma-se de “homem de todas as vidas” a “uma lembrancinha aí” em poucas semanas. Quer saber mais?

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Comentários em blogs: ainda existem? (4)

  1. Metade das pessoas que eu conheço jah tinham cantado a bola…a impressa ia acabar com o forum social e só falar das briguinhas bestas deixando de lado tudo de proveitoso que saiu desse encontro….eh fazer o que neh??=/Bom…ainda estamos na semana ABBEY ROAD lah no meu blog…passe por lah qdo puder…THe Blues Girl…=)

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