Como uma idéia viral se transformou numa empresa

O que faz você aplaudir alguém que, em algum momento de sua carreira, recebeu um prêmio? Algumas respostas possíveis passam pela tradição, pela transparência no processo de indicação dos eleitos, pela credibilidade de quem está por trás do negócio… Dependendo da situação, uma destas variáveis toma corpo maior: alguém poderia dizer que “O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias” não vai concorrer ao Oscar de melhor filme estrangeiro por causa “daquela máfia que só leva em conta o lobby das produtoras e distribuidoras”. Ou simplesmente “respeita os critérios da academia”, afinal de contas trata-se de uma instituição muito bem resolvida.

Exitem casos onde o prêmio em si não é mérito algum. Não faltam exemplos tupiniquins: já vi e ouvi diversos comentários questionando a validade de premiações como o Jabuti, que deveria ser uma festa da literatura nacional. Claro que todo autor merece ser lido e, se possível, alavancar vendas. Mas o que dizer da escolha do “livro do ano” feita pelo voto dos membros da Câmara Brasileira do Livro, formado por donos de editoras e livrarias? Experimente rever calendários de eventos antigos e surpreenda-se com associações, universidades e afins também aproveitam a luminosidade ao redor de um “prêmio” para indicar anualmente profissionais e empresas, mas sempre com algum interesse oculto por trás.

Então chegamos à web, onde é muito mais fácil aparecer um “Malaco Awards” genérico envolvendo sites e blogs. Espécies de “The Bobs Wannabe” espalhados rede afora. Lógico que você conhece gente muito boa por trás da criação e organização dos mais variados concursos, mas a maioria não esconde o desejo de replicar o mais famoso e bem sucedido modelo do gênero do país. Aquele que, mesmo após mais de ano sem ninguém citar, é capaz de espalhar uma bolinha dourada em seus templates em busca de votos e muito sucesso.

Em 1995, a Internet ainda era privilégio de poucos brasileiros. A Embratel convidou alguns poucos para testar a brincadeira, enquanto outros mais abastados descobriam a Compuserve, em ligações internacionais. Nesse meio tempo, uma empresa especializada em promoção de eventos, com sede no bairro do Botafogo, Rio de Janeiro, começava a observar o crescimento dessa rede com atenção.

Assim, a Mantel Marketing criou a Mantelmedia, editora que trouxe para o Brasil a versão brasileira da revista Internet World. O primeiro número saiu em setembro de 1995. Meses depois, surgiram os primeiros provedores de acesso, fazendo com que os BBS e o videotexto começassem a perder espaço para essa nova forma de interligação entre os computadores. Rapidamente, a World Wide Web e suas páginas em HTML viraram coqueluche. A empresa carioca percebeu que isso realmente poderia render ótimos negócios. Só não sabia direito como. Ainda.

Pouco depois do lançamento da revista, foi criado o Internet World Best, um concurso que premiou a melhor home page corporativa e pessoal daquele ano. Convém ressaltar que, naquela época, não havia muito além da home-page (por isso não era site), e o Cadê ainda era absolutamente nada perto do Yaíh, catálogo oficial da Internet brazuca naquele ano, com apenas algumas centenas de páginas nacionais.

Em um ano, a Internet decolou no país. Pipocaram centenas de provedores de acesso. Todo mundo descobria o prazer do e-mail (praticamente sem spam) e muitos bolavam suas páginas pessoais no Geocities. Terra ainda era Zaz, e Submarino ainda era Booknet – que aliás, concorreu em uma das 12 categorias do segundo prêmio Internet World Best, em 1996, definida desde aquela época como “a premiação mais importante da Internet brasileira”.

Enfim, como dizia, a Mantel ampliou o concurso para 12 categorias em 1996. A Booknet, por exemplo, concorreu em Serviço e Comércio, ao lado do Cadê, Universo Online e Zaz. A melhor página pessoal era a Gun’s Hot Page, repleto de downloads, fotos e piadas, que consagrou o jovem Murilo Gun Araújo, atualmente na deliciosa carreira do stand-up comedy. A procura pelo prêmio aumentou e, a cada ano, a Mantel corrigia os erros do anterior e incluía novos elementos.

Em 1997, o Internet World Best virou IW Best, e pela primeira vez, ganhou a imagem da “bolinha” que o caracterizaria para todo sempre. Nessa altura, já eram 16 categorias, voltadas para os mais diversos ramos de atuação e negócios, atiçando empresários de todos os setores. O crescimento foi impressionante: foram cinco mil inscritos e 180 mil votos computados. Aos poucos, a coisa foi tomando corpo: quem cuidava o seu site percebeu que, se fizesse um bom trabalho, poderia conquistar o tal prêmio e, com isso, algum prestígio. Em contrapartida, os concorrentes divulgavam a marquinha do prêmio em lugar de destaque, popularizando-o ainda mais. Bingo!

Em 1998, o prêmio passou a receber o nome iBest. Foi o primeiro ano com a figura da “iBest ball” contaminou a web, fazendo com que as primeiras vozes contrárias a essa estratégia de “marketing viral” aparecessem. Foram poucas, incapazes de impedir a consolidação desta propaganda gratuita bem feita. Em 1999, a revista Internet World deixou de circular, e uma nova empresa, com o nome do prêmio, ocupou o lugar da Mantel. O iBest cresceu tanto que, no segundo semestre de 2001, a empresa fechou um acordo com a Brasil Telecom, que seguiu o caminho de transformar o prêmio numa lucrativa e diversificada empresa, incluindo provedor de acesso e portal de notícias. Em junho de 2003, a empresa de telefonia assumiu totalmente o controle da empresa, o que culminou com a fusão de suas empresas similares em 2006: iG e BrTurbo.

Curiosamente, o ano da fusão havia sido a última grande premiação do iBest, comemorando onze edições, quatro milhões de votos em toda sua história (um milhão só naquele ano), 30 mil sites inscritos em 40 categorias. Um sucesso indiscutível e merecido, mas que esbarrava em algo notoriamente incômodo: a tal “academia”. Instrumento útil para valorizar não apenas o site que consegue muitos votos a todo custo, mas relegando a votação popular a um plano secundário.

Para um prêmio que só cresce à medida em que o povo divulga espontaneamente, é perigoso criar, por exemplo, um prêmio especial para blogs e entregá-lo ao “Eu, Hein” todos os anos. Mesmo os maiores divulgadores do iBest não devem ter razão para questionar a idoneidade da escolha, mas pergunte a um desses insistentes, que jamais foram premiados, o que acham sinceramente da imagem do prêmio. Enfim, novamente uma porção de sites e blogs vão tentar convencê-lo a votar no Prêmio Ibest, que voltou em 2008 com uma primeira fase baseada numa “grande enquete”. Fico feliz em rever o turbilhão provocado pelo “Oscar da Internet brasileira” outra vez, e desde já espero realmente que os mais competentes e esforçados comemorem a vitória.

Admito que não perderia a boca-livre (inclusive já estive nela, graças ao Inagaki), mas nunca vi com bons olhos este prêmio. Não por ter chegado aonde está graças a uma forma gratuita de anunciar em milhares de sites (tanto bons quanto ruins), nem por ter parado durante quase dois anos, como um vírus que fugiu do controle. A questão é: se pudermos realmente comparar o prêmio ao Oscar, o mesmo deve valer para os critérios de escolha. Apesar da comunidade que circula ao seu redor, nem sempre melhores filmes aparecem na festa, simplesmente porque o lobby não foi suficiente. E quando um é escolhido o melhor, outros muito bons são fatalmente excluídos.

André Marmota tem uma incrível habilidade: transforma-se de “homem de todas as vidas” a “uma lembrancinha aí” em poucas semanas. Quer saber mais?

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Comentários em blogs: ainda existem? (6)

  1. Kinda offtopic, o Eu Hein acabou, definitivamente o cara não manteve o pique que um blog exige atualmente.

    Eu descobri por acaso que estava concorrendo, nem me importo de divulgar o site, até porque estão precisando de uma força, hehe…

  2. André!

    Pelo histórico tumultuado (em nenhum momento ele passa a noção de um formato definido)ele ainda é mutante.
    Escolhas, sejam elas feitas por academias ou voto popular, têm nas distorções o elemento derivado dos vários interesses, próprios de cada área, seja ele econômico ou político.
    Isso, é inevitável no concurso de Miss Universo,nas indicações ao Oscar e todos os outros onde as instituições ficam mais realistas que o rei.
    Sei não… mas acho que nem o Nobel escapa disso…
    Quer um exemplo inverso, só para elucidar?

    Que tal o Paulo Coelho na Academia Brasileira de Letras?
    Se não o escolhessem, ninguém notaria, reclamaria e nem uma única linha escreveriam contestando.
    Como o escolheram, passaram a notar a ABL, para ela dirigiram-se as luzes.
    Para o “escritor”, estou certo que, escolhido ou não, em nada mudaria sua vida (vendas, pretígio, etc…).
    Então, escolher o Paulo Coelho foi bom para a ABL.
    Mas, de maneira geral, ninguém coloca azeitona na empada alheia se não puder dar uma mordida.

    Abs!

  3. O bom foi que a premiação surgiu na hora certa. Me lembro que, nos tempos pré-históricos da net, haviam inúmeros prêmios, mas me parece que de todos eles só o IBEST se manteve.

    Daqui a alguns anos, a Globo vai transmitir a festa, com direito a artista apresentando e tudo (se os roteiristas n quiserem fazer greve…)

  4. Nunca tinha pensado nesse paralelo!

    É realmente algo a se pensar…
    Mas o Oscar a muito deixou de chamar a minha atenção… É mais fácil eu acompanhar o Framboesa…
    HEHEHHE
    O msmo se aplicaria ao Ibest!!
    IRa me divertir mais acompanhando um IBesta…
    😉

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