África do Sul é campeã mundial!

Pouca gente sabe, mas terminou neste sábado a terceira competição esportiva de maior audiência no mundo – só perde para a Copa do Mundo de futebol e os Jogos Olímpicos. Todos os espectadores presentes ao Stade de France, em Saint Denis, além de outros milhões de espectadores, viram a África do Sul derrotar a Inglaterra por 15 a 6 e conquistar o troféu William Webb Ellis, o que valeu o segundo título mundial aos Springboks – igualando o número de conquistas da Austrália. Vai dizer que não ficou sabendo dessas coisas todas?

Não se sinta desprestigiado. Pouca gente nesse enorme país tropical acompanhou Mundial de Rugby, na França. Um deles é o Doni, que não apenas acompanhou a maioria das partidas como ensaiou sozinho em seu quarto a Haka, tradicional performance da seleção neozelandeza. Os populares “All Blacks” são considerados a melhor equipe do mundo (futebolisticamente, é uma espécie de Brasil do rugby) a ponto de uma camisa oficial, em qualquer loja esportiva de Paris, custar a bagatela de cem euros (quase trezentos reais). Felizmente, meu bom senso fez com que eu economizasse uma graninha em mais essa compra perdulária: os All Blacks, apesar do rótulo, foram eliminados pela França, donos da casa, já nas quartas-de-final. Aliás, em uma partida que terminou em 20 a 18 (deve ter enfartado uma porção de gente por lá).

Enfim, passei pela “cidade luz” quando o torneio ainda estava na sua primeira fase, e todas as lojas, bares e restaurantes respiravam os ares da competição. Livrarias instalavam logo na porta uma estante repleta de publicações relacionadas ao tema. Era impossível não saber o que estava acontecendo: uma gigantesca bola oval, com a sigla da National Rugby Board, podia ser vista bem no meio da torre Eiffel. Além disse, um telão gigantesco transmitia todas as partidas em um telão diante do Hôtel de Ville, a prefeitura da cidade. Tive a chance de ver meia dúzia de três ou quatro gringos acompanharem alguns lances de Samoa x Estados Unidos. Antes, num café, fiquei meia hora tentando entender o que acontecia diante de um Namíbia x Geórgia (futebolisticamente, é uma espécie de Arábia x Bolívia).

“Puxa, mas isso foi no fim do mês passado… E a decisão só foi agora?”. Pois é, o Mundial de Rugby começou no dia sete de setembro – praticamente um mês e meio para a disputa de apenas 48 partidas! Bom, para quem já teve a chance de tentar entender como funciona, a explicação é simples: os atletas precisam de pelo menos uma semana para se recuperar entre um jogo e outro. Resumidamente: depois de assistir a uma partida, você vai concluir que futebol americano é esporte de mariquinha. Também vai se perguntar como ninguém morreu em campo – há registros de uma ou outra cicatriz e, no máximo, uma ou outra fraturinha de nada.

Como qualquer esporte, a dinâmica é simples: cada time, com quinze pessoas cada, precisa levar a bola para o outro lado do campo. Também é possível marcar pontos chutando a bola por cima da trave – dependendo da situação do jogo, esses chutes valem um número diferente de pontos. Quem está com a bola só pode passar para alguém que estiver atrás, ou chutá-la para frente. Os adversários, evidentemente, tentam impedir de todas as formas: é quase impossível para qualquer um cuja cultura seja baseada no futebol entender quando é falta ou não. Pode quase todo tipo de pegação ou porrada. Outra curiosidade: apenas o capitão da equipe pode dirigir a palavra ao juiz, cuja soberania é indiscutível.

Mas apesar de parecer agressivo, é sem sombra de dúvidas o esporte com maior espírito de coletividade. Nenhuma seleção é capaz de vencer uma partida com um único craque, ainda que ele seja um exímio chutador. É preciso estratégias muito bem executadas, com a participação sincronizada de todos os jogadores. É muito interessante observar cada ponto forte das grandes seleções: os “All Blacks” são muito ágeis no passe; os ingleses chutam com perfeição; os franceses, que nem são tão tradicionais assim (futebolisticamente, é uma espécie de Portugal), capricham na defesa – a ponto dos narradores da TV5 vibrarem a cada jogada desse tipo.

Pois diz a lenda que esse é o segundo esporte coletivo mais praticado no mundo, além de ser um irmão do futebol (também nasceu na Inglaterra no fim do século 17, graças a um engraçadinho que pegou a bola com a mão e saiu correndo). Apesar de tanta tradição, esta foi apenas a sexta edição da Copa do Mundo (a primeira foi em 1987). Mas nem isso explica o fato dos brasileiros ignorarem quase que por completo a modalidade. Nem mesmo o fato da Argentina, rival brasileiro em qualquer disputa mequetrefe, levar o rugby a sério tanto quanto o futebol (Los Pumas ficaram com o terceiro lugar, em cima da França), a modesta seleção brasileira está a léguas de distância de qualquer outro país sul-americano. Impressão de alguém que tomou contato rapidamente com o esporte em uma viagem de férias: será que não daria para chamar uma porção de lutadores de vale tudo, dar a eles noções táticas e botar pra quebrar? Rumo à Copa de 2011, Brasil!

Quer mais?

– Encontrei um texto do Bender, cujo título parece até uma ironia: “jornais boicotam a Copa do Mundo de Rugby”. No Brasil? Claro, todos eles.

– O Paulo Radtke deixa uma questão interessante no ar: seria o rugby um esporte de brancos?

– Finalmente, no Update or die, um vídeo resumindo França x Nova Zelândia, certamente o grande jogo deste Mundial.N

Comentários em blogs: ainda existem? (6)

  1. O seu entusiasmo nos primeiros parágrafos fez o post irresistível. Agora entendo melhor um outro que li de um blog francês.
    O rugby é parecido com o futebol americano, dizem. (protestos do pessoal do rugby,) Se aqui nos EUA o futebol americano tem nos negros suas estrelas principais, deve ser por outro motivo que a aptidão que o rugby seja esporte de branco.
    Bom dia, Marmota, tudo bem?

  2. A grande prova de que apenas um grande craque não ganha jogo foi essa Inglaterra da final, não? Mas ainda vamos discutir durante décadas a decisão daquele juiz de vídeo que anulou o try que daria, naquele início do segundo tempo, a vantagem na partida… O Rugby é um grande esporte, um jogo de hooligans praticado por gentlemans. Se é um esporte de brancos? Infelizmente ainda é um esporte das classes mais “abastadas” na maioria dos países (exceto a NZ, talvez). Isso tem relação com a história (África do Sul e Inglaterra jogaram pela primeira vez em 1891, por exemplo). A África apenas recentemente começou a derrubar o apartheid e é bem provável que a cor majoritariamente branca da equipe seja mais uma questão econômica que racista. A França é Portugal? Acho que está mais para a Espanha, pq tem um campeonato muito forte.

  3. Eu confesso que não conhecia, mas gostei pra caramba de assistir à Copa. Também ajudou o fato de a ESPN Brasil ter dado show de cobertura, com uma didática ótima para ignorantes como eu.

    Só que o fato de não ser esporte olímpico e não ter brasileiro na disputa atrapalhou muito na cobertura da Copa do Mundo do Pique-bandeira viril. Eu, empolgado com a competição, ainda tentava encaixar alguma coisa de rugby no meio do noticiário de futebol internacional.

    Mas, claro, não é o suficiente.

  4. Voce chegou a ver o video do post? Tentei deixar meio ambigua a pergunta, mas pouca gente sacou. Outra coisa qu’eu notei e que tem alguns resistentes no Brasil que praticam esse outros esporte bretão, geralmente no rio e em são Paulo. E so para completar os eu rico post o maior evento esportivo depois das Olimpiadas e o Tour de France.

  5. Eu estava no interior da França no dia do jogo contra a Nova Zelândia: após o jogo, a comemoração foi de título.

    Assisti na TV (já em casa) o jogo de sábado (e torci para os Springbocks).

    Na Zero Hora, ele falaram da final no sábado, inclusive explicando como funciona o rugby.

    abraço!

  6. Acompanho Hugby desde o campeonato mundial que a Inglaterra venceu. Isso que é esporte de macho de respeito.

    Outro dia li que um jogador de hugby foi ao médico com dor de cabeça. Depois de uma tomografia, descobriram que tinha um dente na cabeça do camarada, encravado. O dente entrou lá numa trombada em um jogo, quando o adversário bateu a boca nele.

    E ele nem tinha reparado!
    Pra mim, se o cara joga hugby, ele pode até tomar suquinho de framboesa que continua sendo muito macho.

    Abraço

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