A amiga sueca do Pelé

Houve um tempo em que o brasileiro tinha certeza: ao contrário de qualquer nação do planeta, era possível escolher os melhores jogadores de futebol entre uma porção de craques. Inevitavelmente, o potencial de nosso escrete seria suficiente para torná-lo imbatível em qualquer competição. Claro que, seja por uma briga entre São Paulo e Rio de Janeiro ou por teimosia de alguém quem sustenta um treinador inexperiente, o Brasil faz sua parte para garantir a imprevisibilidade do esporte. Por coisas assim, foram necessárias cinco edições da Copa do Mundo para que chegássemos ao primeiro título.

Enfim, o dia 29 de junho de 2008 marca o aniversário de 50 anos da conquista protagonizada por Gilmar, Nilton Santos, Orlando, Bellini, Djalma Santos, Didi, Zito, Zagalo, Garrincha, Vavá e Pelé, organizada dentro de campo por Vicente Feola e fora dele por Paulo Machado de Carvalho. A vitória por 5 a 2 contra os suecos na decisão reuniu quase 52 mil pessoas no estádio Räsunda, casa da seleção da Suécia e do simpático AIK. Diz a lenda que, em 2011, a Federação Sueca deverá inaugurar uma arena mais moderna e demolir o mítico Räsunda, dando lugar a edifícios comerciais e residenciais.

Sendo assim, faça como Lello Lopes e eu: visite-o antes que acabe!

Na manhã de quarta-feira, 12 de setembro de 2007, deixamos a porcaria do nosso hotel Formule 1, perto da estação de metrô Telefonplan. A linha 14 do “tunnelbana”, vinda de Fruängen com destino a Mörby centrum, passa pela T-Centrallen, espécie de “estação Sé” da capital sueca. Ali fizemos a baldeação para a linha 11 azul, sentido Akalla, até o desembarque na estação Solna Centrum.

Solna é uma pequena cidade da região metropolitana de Estocolmo, a uns cinco quilômetros à noroeste. Ao lado da estação, um convidativo shopping center elimina a sensação de estar num lugar desconhecido ao redor de gente que fala um idioma estranho. Antes de chegar à passagem sob a via expressa Frösundalenden, rumo à avenida Solnavägen, vimos enormes bolas de concreto alusivas ao futebol enfeitando o trajeto. Bem na passagem subterrânea, os suecos relembram seus grandes jogadores, numa “parede da fama”.


Entre alguns nomes terminados em “lsson”, um conhecido: Dahlin, daquele time de 94 que ainda tinha Brolin e o folclórico goleiro Ravelli

Em poucos metros de caminhada, foi possível enxergar uma das fachadas envidraçadas do Räsunda, ao lado de um modesto estacionamento. Uma volta pelos arredores revelam um bairro tranquilo – lembra um pouco a Arena da Baixada, em Curitiba. Caímos na Parkvägen e descobrimos a lojinha de souvenirs do AIK Solna. Passaria despercebida se parássemos na Solnavägen, satisfeitos com a recepção que tivemos na federação sueca de futebol.

Portas abertas para o bem cuidado lobby. Paredes azuis trazem fotos históricas e do time atual. Entre os símbolos que decoram o ambiente, a camisa amarela da seleção nórdica fica em posição de destaque. Mal deu tempo de contemplarmos o ambiente: ouvimos o alô de uma dona muito simpática, que trabalhava em sua salinha.

“Bom dia, gostaríamos de conhecer o estádio, como podemos fazer?”, perguntamos, em inglês para sueco entender. “Bom, aqui não fazemos visitas guiadas, mas eu posso abrir a porta para vocês conhecerem o campo, tudo bem?”. Mas assim, sem pagar nada? Puxa!

Não demorou para Mona Hawselblad, a recepcionista do Räsunda, perguntar de onde éramos. Abrimos nossos casacos e exibimos com prazer nossas camisas da seleção brasileira. Enquanto sorria e nos convidava para tirar um retrato, contou entusiasmada: “eu tenho uma foto com o Pelé!”. Ah, vá!


“Digam xis!”, disse Mona Hawselblad, em inglês pra brasileiro entender, ao bater a chapa acima nas arqubancadas do mítico Räsunda

Antes de nos despedirmos, a simpática secretária da federação sueca voltou à sua salinha e pegou brindes (um postal da seleção sueca e uma caneta para cada), além de um porta-retratos. Nele, Mona aparece alguns anos mais jovem, ao lado do Atleta do Século. Ela tinha 26 anos quando, em 1995, o então ministro dos esportes do governo Fernando Henrique Cardoso visitou o Räsunda. O pedido da foto, negado pelos seguranças, foi atendido pelo Rei do Futebol. A imagem virou um grande motivo de orgulho para a “amiga sueca” do Pelé.


A história também foi contada pelo repórter Jefferson Rodrigues do diário Lance, publicada em 26 de março, às vésperas do amistoso Brasil x Suécia em Londres
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Ainda não cansou da overdose de comemorações dos 50 anos do primeiro título mundial brasileiro? Navegue pelo competíssimo especial do UOL Esporte, assista ao documentário do jornalista José Carlos Asbeg ou ainda ouça a transmissão da finalíssima, cortesia da Rádio Nacional.

Comentários em blogs: ainda existem? (4)

  1. Estou escutando a Rádio Nacional. Fico tão comovida, especialmente porque já era viva, tinha seis anos de idade, e no Rio de Janeiro foi uma feata enorme.
    Todas as referências se fazem vivas. É super-emocionante.

    Principalmente porque ver as seleções do “Tri” é quase igual a ver o Botafogo.

  2. Só queria saber uma coisa: o porquê de na Europa mandarem às favas as tradições futebolísticas e os templos sagrados do esporte de maneira tão sem dó e sem dor. Esse Räsunda, olhando um pouquinho atentamente, tem umas coisas que lembram São Januário, principalmente nas partes próximas aos gols.
    O implodismo afetou até mesmo ao estádio de Wembley, que só conserva a fachada do original, tendo sido todo destruído e reconstruído por dentro. Porém, já sem o charme do Wembley.

    Nessas, à exceção da lamentável Fonte Nova e suas lajes quase de isopor, mais um ou outro caso isolado, não vemos o implodismo se manifestar no Brasil, graças a Deus. A qualquer localidade maior que se vá no País, temos estádios que, se não estão em um nível europeu, serão tão lembrados daqui a uns mil anos ou mais quanto é o Coliseu de Roma (estádio esse que nos tempos do pão e circo enchia de água o campo em seis horas e que podia ser totalmente evacuado em cinco minutos).
    Lembram-se de quando o Havelange sugeriu que deveriam implodir o Maracanã e fazer no lugar um estádio menor? Provocou uma bela polêmica e, mais ainda, a indignação dos compatriotas. E não sem justa causa, pois é um marco não só no futebol, como também na engenharia mundial. Foi feito em apenas dois anos (em vez de licitar a obra inteira, partiram em quatro quartos, cada um com licitação diferente, o que possibilitou acelerar a construção), foi das primeiras aplicações brasileiras de estruturas suspensas de concreto armado (a ponto de o engenheiro-chefe ficar em pé sobre a cobertura para mostrar que ela não precisava de colunas nas extremidades internas, quando da retirada das estacas de sustentação), fora um bocado de outras coisas. Imagine se alguém falasse aqui em São Paulo de demolir o Pacaembu. Aliás, seria mais que interessante retornar a concha acústica por lá.
    Só espero que essa tradição do não-implodismo continue firme e forte em 2014, ainda que tenhamos um novo estádio para substituir a Fonte Nova, por motivos óbvios.

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