Testemunha do inimaginável

Após nove meses e alguns pontos corridos e recorridos, terminou o Campeonato Brasileiro de 2003. Com o Cruzeiro campeão há séculos, restaram emoções na última rodada apenas para quem estava ou prestes a cair, ou pertinho de uma vaga na Libertadores 2004. Eram os casos de São Caetano e o glorioso Sport Club Internacional, que se enfrentaram no último sábado.

Parada dificílima. O Azulão contava com um retrospecto invejável antes mesmo da decisão: jamais havia perdido para o Colorado em sua curta carreira na elite. “Tabus existem para serem quebrados, e sempre existe uma primeira vez”, pensei, antes de ir ao simpático Anacleto Campanella, no ABC paulista. Para dar sorte, convoquei o estúpido Lello Lopes, minha amiga de infância e vizinha Priscila (que nunca tinha ido a um estádio), e a Amanda, que vestiu a camisa do Inter para torcer também! Pena que era a do Inter errado, aquele de Milão…

Rapidamente o quarteto se misturou com os centenas de torcedores colorados, muitos deles vindos do sul em um dos dez ônibus fretados especialmente para a partida. Certamente foi o maior público do Inter fora do Beira-Rio neste Brasileirão.

Com o time dentro de campo, a festa provocada pela bateria e pelos cânticos importados da Argentina foi reforçada por bexigas vermelhas lançadas ao céu. Ali deu pra perceber ainda que, além de mim, haviam outros torcedores “estrangeiros”: uma breve pausa entre um nome e outro durante a escalação dos jogadores pela torcida. Como se quisessem dizer “qual a gente grita agora”. Traduzindo: “Uia! Não sabemos quem vai jogar!”.

A festa prosseguiu durante os primeiros minutos de jogo, mas o time não correspondia na mesma vibração. Durante quase meia hora, o gol de Sílvio Luís – bem em nossa frente – foi importunado apenas uma vez. Desorganizado, o Inter não conseguia criar uma única jogada, e quando chegava perto, esbarrava na competente marcação do Azulão – bem ao estilo do ex-gremista Tite, um dos alvos da torcida. O outro era o árbitro Elvécio Zequeto, que estava tão fora de sintonia em campo quanto os colorados.

Quem estava em pé cansou e decidiu sentar. Quem ainda não estava com sono, tentava convencer o técnico Muricy Ramalho, aos berros, a mexer no time. Aos 35 minutos, a torcida do São Caetano, que também é um cochilo só, acordou com o gol de Zé Carlos. De onde estávamos, não deu para ver a jogada. “E o ataque do Inter vai ser lá no segundo tempo, não vamos ver um único golzinho nosso daqui”, acreditava.

Mal sabia o que estava por vir: naquele sábado, não veria golzinho do Inter em qualquer lugar. Na etapa complementar, o desespero do time, que precisava de um mísero empate em São Paulo, aumentou. Jefferson Feijão bem que tentou mudar a história da partida logo aos sete minutos, mas parou nas mãos de Sílvio Luís. Ainda mais perdidos em campo, os gaúchos viram Warley, outro ex-gremista, fazer 2 a 0, aos 15 minutos.

Das arquibancadas azuis, ouvia-se “Eliminados”, ou o criativo “gaúcho viado”. Alguns colorados não quiseram ouvir mais nada e deixaram o estádio. Confesso que pensei o mesmo, mas decidi ficar, ao lado dos poucos que ainda alimentavam esperanças. “Torcedor tem que apoiar o time até o final”, disse Lello. Bem feito: dez minutos depois, Marcinho cruzou, Clemico não viu e Somália fez o terceiro.

Com a derrota consumada, os ânimos dos torcedores se exaltaram. Os mais organizados gritavam “Vergonha!” aos atletas. Outros mais perplexos atiravam latas de cerveja no gramado – sim, os vendedores do estádio esqueceram de ler a cartilha e trataram de distribuir a munição. O temperamento explosivo culminou em ação policial, que levou alguns mal-encarados para fora. “Essa polícia é assim mesmo, por isso que esse é um estado de merda”, gritou um mais afoito, carregando no sotaque.

Ainda não era o fim. Faltando dez minutos, Tite escalou Adhemar, que deu o passe para Warley fazer o quarto e, cobrando falta, mandou sua conhecida bomba, selando o maior vexame do Internacional na história dos campeonatos brasileiros. Sem afirmar categoricamente, esta deve ter sido também uma das maiores goleadas na história do São Caetano, que mesmo em quarto lugar – e na Libertadores, ainda terminou com um dos piores ataques do torneio. No fim de semana que pegaram Saddam e expulsaram os radicais, fomos testemunhas de algo ainda mais incrível. Belo dia para a minha amiga Pri conhecer um estádio…

E o Inter morreu na praia, por um ponto. Que poderia ter sido conquistado diante do mesmo São Caetano, em casa, naquele empate sem gols e sem graça. Ou mesmo no último Gre-nal, quando também perdemos em casa. Ou em qualquer outra das inúmeras bobeadas cometidas pelo Inter nos últimos nove meses e ninguém dava bola, afinal “o campeonato é longo”. Quem planta, colhe> lição ainda mais dolorida para quem sonhava alto e decidiu viajar longos mil quilômetros para se decepcionar no fim.

Enfim,

– Terminei o ano com 50% de aproveitamento no estádio. Foram duas vitórias – Figueirense, com a namorada, e São Paulo, com o Osiro – e duas derrotas – Santos, com a família, e Azulão, com os amigos.

– Trato é trato: Lello torceu pro Inter sábado e eu torci pro Curintia domingo. Mas o pé estava mesmo gelado e o Grêmio não caiu.

– Em compensação, preciso agradecer por não ser torcedor do Bahia… Mesmo o Marcos VP, que viu o Fortaleza cair, deve pensar o mesmo.

– Já o Coritiba, time que o coração da Cacau adotou, fez sua parte e está na Libertadores, ao lado de Cruzeiro, Santos, São Paulo e São Caetano.

– Artigo da Agência Folha: Campeonato Brasileiro acabou sem deixar dúvidas, concluindo que vale a pena manter a fórmula. Você concorda?

Comentários em blogs: ainda existem? (12)

  1. Aí, André…. Q pé frio!!!!!! Digamos q lembrei de vc durante todos os gols do São Caetano. Ainda bem que eu não torço pro Inter. Imagina sair do sul do país, vir ate aqui e ver meu time ser literalmente goleado. Deus q me livre!!!! e tem mais, eu fui ao estadio mais que você neste ano que passou…. será um defeito grande demais?
    beijos
    Cy

  2. Juro que enquanto ouvia o jogo do Coxa e eles comentavam dos lances do S.Caetano x Inter, torci muito para que o Inter se recuperasse! Prefiria o Inter junto do Coritiba na Libertadores!

  3. Ah, esqueci de responder sua pergunta:
    Eu concordo, sim, em manter a fórmula do campeonato. Acho que, independente de o Cruzeiro não ter deixado pra ninguém esse ano, até a última rodada a maioria dos times tinha jogos decisivos. Eram os times tentando não serem rebaixados, os times tentando a classificação para a Sul-Americana e para a Libertadores… O que embora longo o campeonato, levou as torcidas para os estádios… E não tem perigo assim de “tropeços” tirarem da final o time de melhor campanha! Eu, que nunca acompanhei tanto futebol como este ano, acho que ficou melhor assim!

  4. Bwa-ha-ha-ha!
    Se f**eu!!!
    Bem, meu caro, Ano que vem você pode me sacanear quando meu time for eliminado da Libertadores…mas, por enquanto, o negócio é aloprar quem não está lá! Hehehe!

  5. Se o meu Vasco tivesse caído, eu não tinha ficado tão triste…

    O pior é que eu torço pro Bahia também. As cores são iguais às do Fortaleza. E em 88 o time de Bobô e cia arrebentou… Lembra?…:-)

    Domage. LEÃO,Ê, Ô!!!!

  6. É Marmota, não tenho muito mais o que comentar depois de nossas mensagens por email, mas q tal vc recomeçar a torcer para o Noroeste de Bauru?!
    hehehe
    [ ]’s,
    Capela
    (Viva o Timão!)

  7. Marmota!

    Olhando as imagens, descobri porque o Inter afundou. Você estava usando uma camisa de cor AMARELA. Com isso o Inter AMARELOU.

    Você devia ter usado a camisa do Tricolor paulista que eu te dei! Aliás, o que você fez com essa camisa? Tá vendo? Até a camisa do Inter servia.

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