Talvez essa seja uma boa hora para explicar a todos a razão pela qual as atualizações estejam ficando raras por aqui. Normalmente, eu tenho as manhãs livres para dar uma navegada, rabiscar algumas idéias, responder e-mails… Mas há exatamente um mês resolvi dedicar meu tempo extra em uma causa que julgava perdida. Mas que acabou se revelando muito interessante e prazerosa. Pois bem, estou finalizando um DVD.
Antes que você venha me dizer que consegue fazer isso em alguns minutos, vamos aos detalhes. Você já deve estar careca de saber: há um ano, fiz um curso na Alemanha. Levei minha Mini DV a tiracolo, além de algumas fitinhas. Trouxe na bagagem quase cinco horas de imagens e algumas reclamações dos amigos que lá deixei: o ideal seria assistir ao vídeo finalizado no último dia de aula… E tudo que consegui foi, meses depois, uma edição meia-boca de apenas dez minutos – que você já viu aqui.
Independente do prazo, eu prometi a todos um DVD compilado. Um dia sairia. Enfim, passei os últimos dias fazendo a decupagem, capturando, editando e produzindo a bagaça. Cheguei a conclusão de que, mesmo com equipamentos decentes, só conseguiria fazer um trabalho bacana durante a viagem se deixasse de dormir – e ainda assim talvez não terminasse a tempo. Talvez se eu tivesse ao meu lado uma equipe de produção, com cinegrafista, editor de imagens…
Um ano de atraso – Demorei uma vida para começar a fazer, mas no fim das contas, não me arrependo. Coincidência ou não, o trabalho começou exatamente um ano depois da viagem, fato que serviu de motivação extra. Afinal de contas, enquanto capturava as cenas e anotava o que tinha gravado, todas as datas e histórias vinham à tona: desembarquei na Alemanha num dia 15, conheci o estádio do Schalke num dia 21, fui a Berlim pela primeira vez num dia 25… Provavelmente, se tivesse feito isso durante o curso ou logo depois, o efeito não seria o mesmo. Posso até imaginar minha reação nostálgica quando conseguir desenterrar meus antigos registros em VHS-C…
Mas vamos aos meandros técnicos. Apesar da indiscutível qualidade de imagem da Mini DV, o processo de captura não é 100% digital (entenda-se “arrastar” arquivos como se fosse um cartão de memória). A leitura é feita por um cabo FireWire em tempo real. Ou seja, para cinco horas de gravação, levei pelo menos cinco horas, além da limitação do hardware.
Tudo capturado, hora de organizar as cenas. Para cortar, colar, sobrepor, mixar e todos os seus afluentes, contei com a força do Final Cut Pro. E essa parte ocupou três das quatro semanas dedicadas ao projeto. Além de rever pelo menos duas vezes todas as imagens, decidir sobre o que entra ou o que vai para o lixo é desafiante.
A verdade é que, enquanto filmava tudo, já tinha em mente como seria o produto final. Abarrotado das primeiras imagens, tomei nota dos assuntos e gravei depoimentos da maioria dos participantes sobre cada um deles. Essas declarações serviram como “off” (quer dizer, a declaração que explica a imagem). Foi só seguir tudo em ordem cronológica, renderizar e salvar as sequências de acordo com os assuntos.
Outro desafio nesse processo: decidi identificar todos os personagens que aparecem nas imagens. Em alguns casos, simplesmente não fiz anotações mais detalhadas – registrei só o primeiro nome, ou nem isso. Felizmente, Pai
Google foi maravilhoso: só não encontrei nome e sobrenome de duas pessoas – que, fugindo do jornalismo correto, foram identificados por apelidos inventados por mim. E vamos em frente.
Quase tudo sobre DVD – O Macintosh é perfeito para captura e edição de vídeos, mas para transformar a montagem num disquinho compatível com qualquer leitor arcaico de DVD, a coisa complica. Nas únicas vezes que tinha feito isso, usei o iDVD, espécie de “DVD for dummies”. Mas esse tem uma limitação: 90 minutos de imagens.
Com isso, parti para outra via sacra. O primeiro passo é exportar o projeto para os formatos finais. São dois arquivos separados: o de vídeo, em MPEG, e o de áudio, que também pode ser MPEG ou ainda DTS, PCM, SDDS ou AC-3 – o Dolby Digital.
Nessa descoberta, constatei que poderia ter feito, por exemplo, a gravação do áudio separadamente, com vários microfones. Assim, criaria um arquivo final no formato Dolby 5.1 – com seis faixas diferentes, com direito a efeitos surround. Como não tive nenhuma preocupação sonora (usei apenas o microfone embutido da câmera), o resultado final foi um arquivo .ac3 Dolby 2.0 – o bom e velho stereo, com lado esquerdo e direito.
Exportar o vídeo não tem mistério: como o formato da tela é 720×480, só resta o MPEG-2. Aqui é preciso ajustar o “bit rate” (quantidade de dados por segundo), de modo a conseguir um arquivo final com cerca de 4Gb, para caber num DVD-R. A compressão é feita frame a frame, e nessa hora senti falta de um processador mais rápido: meu pobre iBook levou umas 20 horas para gerar o arquivo .m2v…
Com os dois arquivos na mão, poderia usar o DVD Studio Pro da Apple – mas a versão que tenho simplesmente trava no meio da autoração – processo que também é chamado de “multiplexing”.
Assim, tive que migrar a parte final do DVD para a plataforma PC. Encontrei um programinha free chamado IfoEdit, que transforma os dois arquivos iniciais nos tais .ifo, .vob e .bup – aquelas encrencas indecifráveis que vão dentro de uma pasta video_ts, mas que a maioria dos aparelhos DVD entendem. A única limitação desse brinquedinho é que ele não cria nenhum menu principal, nem mesmo legendas. Mas como meu disquinho é em português e não tem nenhum extra, dispensei as frescurinhas.
Produção em série – Um dos programas para PC mais conhecidos nessa área é o DVD Shrink (batizado por mim carinhosamente de DVD Shrek). Essa belezinha é usada normalmente para reduzir os tais .vob e .ifo para que eles caibam num DVD-R normal. Mas com os arquivos prontos no próprio HD, ele também pode ser útil para gravar algumas cópias do produto final.
Aqui surgiu outra dúvida: será que os players da Alemanha ou mesmo de alguns países da Europa vão ler um disco DVD-R gravado em NTSC? Ou será que vou ter que exportar uma cópia para o padrão PAL, ou ainda outra em VCD, só para garantir? Para não enlouquecer ainda mais, segui em frente com o formato original.
Enquanto minha primeira unidade do filme queimava no gravador, voltei para a prancheta de desenho e começei a desenhar a capinha da caixa. Apesar dos muitos programas próprios para isso, usei o bom e velho Photoshop, levando em conta as medidas mais ou menos comuns dos estojos. Cabe no centro de uma folha sulfite: 272mm de comprimento por 183mm de largura, sendo que a frente e o verso medem 129mm, restando 14mm para o fundo. A versão original da figurinha abaixo está em 72dpi.
Não acaba nunca? – Pessoalmente, achei maravilhoso ocupar minha mente durante um mês em função de um projeto desse tamanho. Poderia perder meu tempo pensando em todas as pequenas coisas que me frustraram durante o ano. Decidi usar toda minha atenção e concentração neste DVD.
Mas logo depois que gravei a primeira versão do filme e, todo entusiasmadinho, botei no DVD player para assistir, anotei uma série de errinhos de edição, problemas de compactação, divisão de capítulos… Não resisti a tentação e optei por refazer algumas etapas (incluindo aquela que leva 20 horas).
A tentação de ficar fazendo isso para o resto da vida, imaginando que esse processo não vai acabar nunca, é tentador. Mas é como se eu ignorasse o ciclo natural das coisas. Ou pior: é como se esse DVD fosse uma droga anestesiante, que me deixaria preso para todo sempre nesse mundo.
Assim, depois do segundo ajuste, decidi encerrar o trabalho duro. Nos próximos dias, virá outra etapa trabalhosa, mas deliciosa: checar o endereço de toda a turma e mandar uma cópia do disquinho – no caso dos paulistanos e dos porto-alegrenses, a entrega será pessoalmente.
Cara, estou impressionadíssimo com a sua dedicação, me velho. Que epopéia homérica!!
Pareceu a minha contra uma tal gripe virtual…
Aquele abraço!!
“Poderia perder meu tempo pensando em todas as pequenas coisas que me frustraram durante o ano. Decidi usar toda minha atenção e concentração neste DVD.”
Isso ainda vira tema para livro de auto-ajuda, hein? 😀
Mas, falando sério, é interessante ver que os processos mudam, mas a preservação da memória é sempre uma constante.
Não há nada melhor que uma boa viagem.
Êba! Viva! Isssááá!
Eu quero!