Marcola presidente!

Duas semanas após o terror ter sido instaurado em São Paulo, com 300 ataques atribuídos ao PCC e centenas de mortes – policiais, guardas, agentes, presos, criminosos e um grande elenco que lotou o IML – parece que o caos voltou ao nível de sempre.

É hora de respirar fundo e observar com mais calma algumas observações curiosas. Uma delas foi o debate produtivo entre dois amigos meus, todos ponderados até onde conheço, mas que mostraram suas opiniões com firmeza em nossos comentários: o Fábio e o Anderson (conhecido entre os amigos como Mr. Pinguim).

Fábio: Ah, mas não esquenta: segundo o governador (o que é aquele monstrengo, gente?), está "tudo sob controle". A crise acabou, o Estado (Estado?) fez acordo com o PCC, e a Polícia saiu como salvadora da pátria... Até o próximo ataque.

Pinguim: O que aconteceu foi uma histeria coletiva. Na verdade, na verdade, não havia o que temer. Os alvos eram fixos, bem imóveis ou inanimados. Mas você bem disse. O medo se alimenta daquilo que desconhecemos.

Fábio: Ops, com todo o respeito... Mas "não havia o que temer"? Ah, tá. É verdade, tá certo. Só 90 mortos num fim de semana, coisa normal. Temor temos que ter em Toronto, Viena, Estocolmo... São Paulo tá tranqüila.

Pinguim: Fábio, Eu não quero dizer que tá tudo uma maravilha. Mas o que adiantou aquele corre-corre todo? Você acha que, se REALMENTE os caras quisessem atingir alvos civis, teriam feito só DUAS vítimas deste tipo? (sendo que as duas estavam acompanhando policiais). Acho sim que a imprensa criou um grande HOAX em torno de tudo isso. Os jornais sensacionalistas, em busca de IBOPE, criaram ontem a tarde um alarme mais forte do que deveria. Um sinal disto é que de manhã estava tudo normal. Depois do meio dia espalhou-se o caos. Coincidência? Fechar escolas? Repartições públicas? A situação é grave? CLARO QUE SIM. Havia notivos para PÂNICO COLETIVO? Duvido muito.

Fábio: Pinguim, 115 mortos em quatro dias (vou repetir: 115 mortos em quatro dias!) são números de guerra, e justificam, sim senhor, todo o desespero da população. Quando criminosos saem por aí fuzilando policiais, metralhando agências bancárias e queimando ônibus, qualquer cidadão civil tem o direito de se sentir ameaçado. Todos somos alvos potenciais, mesmo quando não querem nos atingir. É a ausência total do Estado brasileiro, que sucumbiu, sim, diante do crime organizado. Não enxergar essa realidade é como acreditar em Papai Noel, Coelhinho da Páscoa, ou no Secretário da Administração Penitenciária, que nega o evidente acordo com o PCC para a suspensão dos ataques. O Estado faliu: não conseguiu por forças próprias combater a criminalidade - por isso, negociou. Agora, com o fim do pavor, é natural que as pessoas digam que "nem foi tão grave assim", enquanto gente como Paulo Maluf, Conte Lopes ou Luiz Antônio Fleury Filho defendem a pena de morte, a prisão perpétua ou o extermínio, em pomposas entrevistas na televisão. E as pessoas aplaudem. Enquanto isso, o Brasil continua com sua profunda recusa em investir no que pode, de fato, amenizar a violência: Educação. Parece simples, mas dá um trabalho... E temos preguiça de fazê-lo. Por isso, somos um país tão mal resolvido. E daqui a um tempo, uns anos talvez, o PCC resolve atacar de novo... Aí a polícia sai metendo bala e contém a crise em um ou dois dias. As pessoas dizem que "nem foi tão grave assim" e seguem suas vidas... E assim a gente leva.

Fazia tempo que este blog não via um diálogo bacana. Qualquer hora dessas (depois da Copa, talvez) apresento um ao outro pessoalmente para concluir o debate. Ou recomeçar sem hora pra terminar.

***

Até porque, após o rebu, surgiram brincadeiras como a que recebi por e-mail pelo Geraldo, sem autor, com o título “Campanha Marcola Presidente”.

Vamos aos fatos: só em três dias, entre tantas coisas, ele:
- reduziu o trânsito
- retirou os camelôs das ruas
- reduziu a carga horária de trabalho (sem reduzir o salário do final do mês)
- aumentou o contingente de policiais nas ruas
- mobilizou os deputados
- aumentou o poder da fé entre as pessoas
- potencializou o ambiente para uma subida do dólar e auxiliou os exportadores
- permitiu que as famílias jantassem juntas, tirando as crianças das ruas e os jovens da noite
- baixou a taxa de roubos
- uniu opositores na briga por um mesmo objetivo
- fez os direitos humanos e o ministério público visitarem as prisões e acabou com a revolta...

Sem contar que ele assume que é ladrão. Não propõe acordo nem dança comemorando a pizza! Se do celular, escondido e sob ameaça física fez tanto, imagina do gabinete!

Antes que tenhamos novas brigas e discussões, uma ressalva: a mensagem deve ser encarada como uma brincadeira, além de uma crítica bem humorada à defasagem do sistema penitenciário paulista – que culminou com a demissão do secretário da Administração Penitenciária.

***

No fundo, a “campanha Marcola Presidente”, o debate entre amigos e todas as críticas ao sistema fazem todo mundo pensar em como o tema será tratado nas eleições. Tenho certeza de que a campanha pelo voto nulo, que ganha força a cada dia, vai ganhar novos adeptos indignados com os rumos da nação.

A DaniCast fez um desabafo em seu blog, lamentando demonstrações de intolerância exatamente após a influência desse episódio em suas delicadas posições políticas, muitas delas tão complexas e incompreensíveis como posições religiosas ou futebolísticas. Independente em quem (ou como) votar em outubro, vale a pena refletir sobre algumas questões levantadas por ela (que também recomenda a leitura desse artigo da Maria Rita Kehl:

Quer dizer que estamos MESMO todos à mercê dos outros - políticos, bandidos, corruptos - e todo mundo é de opinião de que nada mais pode ser feito? Que o jeito é votar no candidato oposto ao que votou ou repetir o voto, como boas ovelhinhas do rebanho, sem cobrar nada de quem está no momento no governo, sem exigir que promessas de campanha deixem de ser apenas promessas? Essa é a posição política geral da nação? Votar toda eleição em alguém que ainda não votou ou repetir um voto anterior e rezar pelo melhor? Ser abnegado e resignado "porque não há nada a fazer"? É nisso que as pessoas acreditam?

Como perguntar não ofende, registro aqui mais uma: como fazer para que nosso povo se livre da inércia?

André Marmota é professor universitário e ouvinte frequente da pergunta “mas e além disso, você também trabalha?”. Quer saber mais?

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Comentários em blogs: ainda existem? (6)

  1. Esse argumento da Campanha Marcola Presidente ficou ótimo. Mas é verdade. Qualquer coisa que faça a população acordar do seu estado inercial torna a vida melhor. Atualmente, com as TVs e outros instrumentos de alienação em massa, apenas grandes tragédias, catástrofes e eventos desse tipo conseguem fazer as pessoas acordarem.

  2. Adoraria chegar a uma conclusão, em uma conversa regada a cerveja, como meu “interlocutor” Fábio. Eu acredito que chegaríamos a uma conclusão em comum: o que fazer para que o povo se livre da inércia: Em uma palavra? Mobilização. Em três palavras? Pense ao votar. Em quatro? Dê a resposta na urna! (ops, foram 5!)

    Um abraço!

  3. Ah, peraí, por que deveríamos pensar nisso. O negócio agora é Copa do Mundo. Vamos falar de futebol, beber cerveja, ficar bêbados, comemorar nas ruas. Depois a gente pensa (pensa?) em eleição, violência, nessas coisas que só acontecem com os outros. Bjos querido

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