Manifesto a favor das visitas a estádios pelo mundo

O museu La Chascona, casa que Pablo Neruda construiu para viver com sua amante e futura esposa Matilde em Santiago, era o segundo lugar mais bacana que tinha vontade de conhecer em Santiago. O primeiro, disparado, era o Estádio Nacional do Chile, palco da decisão entre Brasil e Tchecoslováquia, em 17 de junho de 1962. A seleção de Garrincha, Amarildo e companhia venceu por 3 a 1, dando a chance do zagueiro Mauro levantar a Taça Jules Rimet. Era o segundo título brasileiro.

Seria mais uma visita aos palcos das finais de copas em minha lista. Dos que consegui entrar, guardo boas recordações do Monumental de Nuñes, em Buenos Aires; do Santiago Bernabéu; do Stade de France; e do Estádio Olímpico de Berlim. Em Estocolmo, uma delícia: entrei no mítico Rasunda após um golpe de sorte; no mesmo dia, passeamos pelo estádio dos Jogos Olímpicos de 1912, uma relíquia aberta ao público.

Enfim, visitar um estádio vazio, aberto para visitação – ainda que por uma pequena taxa, como em Madri, Saint-Denis ou mesmo o Allianz Arena de Munique ou Amsterdam Arena (que, diga-se, só consegui entrar depois de três vezes) é bom. A experiência fica melhor ainda nas arquibancadas, no meio da torcida.

É assim a cada ida ao Beira-Rio (que mantém um portão sempre aberto para o visitante conhecer o estádio). Foi assim quando vi Atlético e Cruzeiro, comendo o tropeiro do Mineirão. Ou ao lado dos barra-bravas, quando quase fui alvejado com uma bomba de gás, após uma vitória do Boca sobre o Vélez em La Bombonera. Ou na inesquecível vitória da seleção portuguesa por 7 a 1 contra a Rússia, pelas Eliminatórias da última Copa, no José Alvalade, em Lisboa.

Mas quase sempre a visita é frustrada. Ainda segundo minha lista “finais de Mundiais”, os portões do Olympiastadion de Munique, palco da final de 74, estavam fechados. Também já estive em Montevidéu, diante do Estádio Centenário, mas por um azar danado, perdi a chance de assistir a Nacional e Central, pela Copa Sul-americana. Foi exatamente no dia que fui embora – e eu sequer conheci o Museu. Tive azar ao encontrar portões fechados em outras arenas, como o Estádio Olímpico de Atenas ou o Strahov.

Ah, o Strahov. O maior estádio do mundo é o Colosso de Praga, um verdadeiro elefante branco que representa exatamente a grandeza do leste europeu comunista. Cabem nove campos de futebol dentro dele. Para chegar de metrô, só caminhando muito após subir o funicular de Petrín. Mas para quê, se aquela armação decadente vive fechada para visitantes? Aliás, no mesmo dia, até o estádio do Sparta estava fechado.

Enfim, toda essa manifestação esnobe para dizer que, assim como qualquer paulistano que sonha em melhores condições para ir a um estádio, estou acostumado a caminhar longas horas a partir de uma estação de metrô (como a Nuble, em Santiago), caminhar por avenidas desertas (como as avenidas Carlos Dittborn, onde nitidamente fica a “Cohab” da cidade, Marathon e, finalmente, Grécia) e dar de cara com uma grande decepção.

Tudo que encontrei foram portões fechados, algumas famílias passeando ou utilizando parte da estrutura do Parque Olímpico, além de dois turistas fotografando justamente no único portão onde dava para ver um pedacinho do gramado. O único funcionário na entrada alertara quando cheguei: “para fotografar, é preciso autorização”.

Não consigo admitir que eu seja o único potencial turista que visita qualquer grande cidade que tenha um bom estádio ou arena, e esteja disposto a pagar para conhecer detalhes imperceptíveis a quem passa pelo lado de fora. Assim como Salvador, que viu a Fonte Nova acabar após a morte de inocentes torcedores, Santiago também está perdendo a grande oportunidade de conquistar os turistas fanáticos.

***

Escrevi este texto em 05/02/2008, ainda instalado no Hotel Paris Londres, em Santiago. Na época, eram duas as minhas maiores frustrações: além daquela visita malfeita, havia o fato de não conhecer o Maracanã – graças a Luninha, resilvi esta falha de caráter. Enfim, num momento em que o país discute a construção ou reforma de suas arenas para o Mundial de 2014, convém lembrar que os palcos de grandes decisões mundiais ainda aproveitam desta vocação turística para faturar uma graninha.

Agora, antes que me perguntem, não sei o que é mais absurdo: São Paulo construir um novo elefante branco ou a CBF limar o Morumbi por questões políticas. Deviam transferir o Mundial de 2014 pra Colômbia.

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