Ano passado eu fiz uma aposta com alguém apaixonado pelo Fernando Alonso. Tinha certeza de que o antipático não seria campeão mundial. Assim, coloquei minhas fichas naquele que, antes da temporada começar, era o maior candidato a algoz do espanhol. Felipe Massa vinha de uma vitória convincente no GP Brasil de 2006, aquele que marcou a aposentadoria de Michael Schumacher.
Pois nenhum dos dois lados ganhou aposta nenhuma. Em compensação, acompanhamos uma temporada eletrizante, com direito a um turbilhão de informações envolvendo espionagem e punições nos bastidores. O que seria a consagração de Fernando Alonso, guiando uma McLaren competitiva como há muito não se via, se transformou na apresentação de Lewis Hamilton para o mundo da Fórmula 1. E quando tudo indicava para o título nas mãos do novato britânico, nova reviravolta: Kimi Raikkonen, outrora “pé de gelo”, reagiu e virou, finalmente, “homem de gelo”.
Enquanto McLaren e Ferrari polarizava a disputa na frente, o brasileiro Rubens Barrichello sofria como nunca em sua longeva carreira. Começara na Fórmula 1 em 1993, época em que sua única referência para os brasileiros eram as propagandas da patrocinadora Arisco. Foi no cockpit da Jordan que, em 1994, sofreu um acidente muito violento durante os treinos de sexta-feira. Coincidência mórbida: foi no GP de San Marino, aquele onde Senna morreu na Tamburello.
A perda de um tricampeão que mobilizava a audiência na TV pesou nas costas de Barrichello, que apesar de esforçado, não era exatamente um gênio brilhante. Seus resultados na Jordan nunca foram expressivos. Mesmo quando chegou ao time de Jackie Stewart, em 1997, levou tempo até acertar o carrinho branco de motor Ford. Enfim, teve uma melhora expressiva em seu desempenho – culminando com a pole no GP Brasil de 1999.
O ano 2000 foi o começo do “agora vai, Rubinho”. Afinal, era o Brasil no cockpit da poderosa Ferrari, tendo um sobrenome italiano para agradar a torcida, além a experiência de Michael Schumacher como companheiro de equipe. Talvez a grande lembrança positiva de Rubinho naquele ano seja o GP da Alemanha, em Nurburgring. Largou em 18º (péssimo-oitavo), mas graças ao carro-madrinha e à chuva, conquistou sua primeira vitória na Fórmula 1 depois de sete anos. Um pódio comemorado com um longo choro.
Mas a função de “escudeiro” de Schummi, campeão cinco anos seguidos entre 2000 e 2005, só fez aumentar seu rótulo de “bundão”. Vieram outras vitórias, momentos positivos e um vice-campeonato em 2002 e 2004. Mas também tivemos o malfadado dia das mães de 2002, no GP da Áustria, quando Cléber Machado estava prestes a comemorar o grande desempenho do brasileiro no fnal de semana, com direito a pole e liderança de ponta a ponta. “Hoje não! Hoje não!!! Hoje sim… Hoje sim???”. E Schumacher passou no final.
Com a promessa de um período mais agradável e a oportunidade de desenvolver um carro com motor Honda, mesma marca que consagrou a McLaren dos tempos de Senna e Prost, Barrichello decidiu chutar a Ferrari, abrindo a vaga de Felipe Massa em Maranello, e assinar com a então BAR para 2006. Mas a promessa de bons resultados nunca veio. No ano passado, menos ainda: nem em seu ano de estréia, Rubinho havia deixado de marcar pontos.
O carro de 2008 ainda continua uma droga. Mas a nova temporada conta com um elemento novo: o fim do controle de tração. Isso quer dizer que os pilotos terão que mostrar sua capacidade para controlar o carro durante a prova, e aí a experiência de Rubinho pode fazer alguma diferença em relação aos demais. Com esta, já são dezesseis temporadas sem desistir. E mesmo sendo alvo de toda sorte de piadas (inclusive minhas), ele está prestes a superar o italiano Ricardo Patrese, que correu 256 grandes prêmios. Quando largar na Austrália, nesta madrugada, Rubinho completará 252. Nas contas dele, o recorde será ultrapassado na quinta prova, na Turquia.
Por todo esse histórico, pelo fato de não ter aposta alguma, por não acreditar que Nelsinho Piquet será o “Hamilton da vez” para Alonso na Renault e imaginando o título nas mãos de Lewis Hamilton, decidi torcer para o Rubinho neste ano. É como torcer para a Portuguesa: a gente sabe que não vai ganhar, mas apesar de fazer chacota de histórias como o trator que nunca saiu do Canindé quando o estádio ficou pronto, a gente gosta mesmo assim. Vai, Rubinho!
Atualizado – O final eletrizante de “O Senhor dos Anéis” no SBT, ainda que eu lembrasse de rever em DVD quando quisesse, fez com que eu perdesse a largada da prova. Quando o filme acabou, quase a metade de carros já estava fora da prova. Felipe Massa tinha acabado de ver David Coulthard, cada vez mais alucinado, decolando por cima de sua Ferrari. Certamente aquilo desestabilizou seu carro, tirando-o da prova.
Nelsinho Piquet também não teve um bom final de semana. Com problemas no câmbio, sequer conseguiu uma boa posição no grid. Devagar enquanto ficou na pista, saiu praticamente na mesma volta de Massa, com problemas mecânicos. A TV só confirmou as desistências depois do olhar clínico de Galvão Bueno – que num lampejo não viu o carrinho vermelho nem o amarelo atrás de Barrichello.
Galvão estava realmente impossível em sua corrida de estréia. Ignorava solenemente as chamadas de Mariana Becker, a única global realmente na Austrália. “E Kovalainen fez o melhor tempo da prova”, percebeu Reginaldo Leme. “Mas isso foi o que eu acabei de dizer”, reclamou. Também pegou no pé do azarado Raikkonen, cuja recuperação foi comprometida graças a duas escapadas na grama e na brita. “Sem controle de tração, vai ter muita gente grande vendo o mundo girar”. Insistiu na idéia de que o atual campeão marcaria pontos apesar de tudo… Mas foi surpreendido por Nakajima, que não chegou a sair da pista: Raikkonen foi considerado nono colocado. “Uia, então ele não marcou ponto…”. Pois é, Galvão.
Mas tem mais. “Ainda bem que a regra mudou e ele não foi desclassificado”, comemorou o comentarista e piloto Luciano Burti, ao ver que Rubens Barrichello havia sido punido com um “stop and go” após uma barbeiragem sem tamanho nos boxes. Ele entrou para reabastecer na hora que o “safety car” entrou na pista – isto é, boxes fechados. Na saída, o mecânico do “pirulito” (a placa que indica quando ele deve sair) errou, e Rubinho saiu em disparada, derrubando mecânicos e passando no vermelho.
Só que, quando a primeira punição de Rubinho saiu, a imagem da TV australiana mostrava a saída de Barrichello na parada anterior, quando ele se aproximou perigosamente de uma McLaren. Ou seja: a Honda errou feio ao autorizar a entrada do brasileiro nos boxes e na saída ao estilo “boliche”: Rubinho, que estava em quarto e tinha grandes chances de pódio, acabou em sexto. E se a regra não mudou, como lembrou Burti, o fato dele ter sido o melhor brasileiro na prova não vai valer absolutamente nada.
Enfim, Nakajima, Piquet e Rosberg, sobrenomes históricos que dão força ao tal slogan “a fórmula 1 da nova geração”, dividem as atenções com os campeões Alonso e Raikkonen, os velozes Heidfeld e Kubica, o bom Sebastien Bourdais – campeoníssimo na Fórmula Indy, além de Massa, Barrichello e o futuro campeão Hamilton. Essa temporada promete.
(Para acompanhar e entender de verdade o mundo do automobilismo, leia a Bárbara Franzin, o Ivan Capelli, o Livio Oricchio, o Fábio Seixas e o Flávio Gomes).
Hahaha, a comparação entre Rubinho e a Lusa foi muito feliz mesmo… E o pior é que hoje, quando ele consegue fazer uma ótima prova como há tempos não se via, a Honda faz aquela cagada. Humpf!
Mas a corrida foi divertida, apesar do meu sono. Essa temporada vai ser legal, e acho que dá Hamilton desta vez.
André!
Caraca, um dia, você precisa fazer um PDF com um manual “Como redigir pracarai segundos após o fato… ou concomitantemente ao… ou espírita”. E vender pro povo.
Perfeita essa postagem, principalmente nos detalhes. Vi a correta e isso aqui tá um retrato fiel duca!
E não li agora que estou comentando… li pela manhã desse domingo, poucas horas depois então, da corrida.
Para deleite de muitos do blogue, Deus lhe conserve essa energia. E todos os neurônios. E o gravadorzinho. O bloquinho de notas… e o “sei-lá-como-faz” para coordenar no texto o evento do inicio ao fim.
Abs!
Congratulações pela riqueza dos detalhes… só posso imaginar que vc gravou a transmissão. rs
A única parte triste de ter que ver a corrida, é passar duas horas ouvindo o Galvão falar e falando um monte de bobeira.
Beijos
Oi Marmota,
Gostei da sua análise, mas eu desisti de torcer para os pilotos brasileiros, ah, acho que não tem jeito mesmo. Mas, como torcedora fiel, a gente acompanha a F-1 sempre. De madrugada, com chuva, no sol de rachar, fazer o quê?
Voltarei para ler os seus outros textos da temporada.
Bjs
Tô torcendo pelo Piquetzinho. Tomara que seja tão bad boy nas pistas quanto o pai.