Em seu livro Conectado, Juliano Spyer fornece subsídios muito úteis para quem procura respostas a uma pergunta recorrente em BarCamps e encontros do gênero: o que leva pessoas como eu e você dedicarem algum tempo para produzir conteúdo na rede? Seja num blog ou em um fórum, por que diabos existem toda sorte de informação, em forma de artigos ou simples respostas triviais… Tudo isso praticamente sem cobrar?
Parte dessa resposta, segundo Spyer, está na Economia da Doação (do inglês: Gift Economy). É um sistema onde os participantes doam, compartilham seus bens para o benefício coletivo de um grupo. As possíveis formas de retorno surge, entre outras formas, da colaboração dos outros membros (eu dou, mas muitos também, então beleza!) ou pelo simples reconhecimento coletivo.
No caso específico da Internet, os bens valiosos são as informações. A própria rede começou assim, já que o acesso era restrito a universidades e centros de pesquisa. E ao contrário de outros bens, dados podem ser multiplicados e transmitidos a custo ínfimo, sem que a fonte original se perca ou esgote…
…E aqui cabe um adendo. É óbvio que isso funciona em uma teoria bem distante da nossa realidade, e antes que alguém pergunte: por um lado não acredito em nenhum modelo de comercialização de conteúdo web puramente adaptado da mídia convencional. Mas por outro, enquanto não chegamos a uma alternativa, lógico que estou ao lado de quem defende o direito à propriedade intelectual dos muitos piratas espertalhões, que faturam às custas do suor alheio. Fim do adendo, já que o objetivo aqui é outro.
Voltando ao conceito de “gift economy”: se levarmos em conta apenas essa parte da resposta, toda e qualquer produção compartilhada (incentivada com licenças ao estilo Creative Commons) faz com que cada participante doe seu produto (e o tempo gasto no mesmo) praticamente sem um interesse particular definido, mas sim para um bem coletivo.
Já posso ouvir algumas risadas ali atrás… Pois é, não deve ser difícil concluir que, além do valor individual do tempo disponível (aquele que faz você priorizar um texto no blog aos e-mails sem resposta na caixa de entrada), existe uma porção de interesses, todos bem pessoais, que levam alguém a participar de qualquer coisa. E a primeira coisa que nossa mente naturalmente egocêntrica produz é: “esse povo todo aó só quer aparecer”.
Comecei a pensar nisso após uma das três ou nove mensagens contendo questionários referentes a pesquisas acadêmicas sobre esse negócio todo. Normalmente levo uma eternidade, mas participo com prazer, seja quando recebo diretamente na caixa postal ou quando encontro pedidos do gênero em listas de discussão. Recentemente, após uma pesquisa do gênero, recebi um e-mail mais ou menos assim. “Cara, entrei em contato com você e com outros amigos seus, mas depois de um mês, só recebi duas respostas! Meu trabalho vai pro vinagre assim! Será que você conseguria me ajudar para que eles respondam também?”.
Não sei se acabei ajudando… Pelo contrário, interrompi a preocupação do pesquisador perguntando, inocentemente: “ei, será que o conceito de gift economy, que se aplica a fóruns e comunidades afins, não funciona com pesquisas acadêmicas elaboradas?”.
Repeti a pergunta para outros pesquisadores do gênero, e a resposta foi praticamente a mesma do parágrafo acima: ou os usuários chegam ao limite da saturação… Ou pior: querem desempenhar um papel fundamental no projeto, afinal é mais uma chance para “demonstrar minha capacidade, espalhar meu nome e impressionar a galera de Cangaíba”…
Soube de um exemplo magnífico de um ilustre palpiteiro em blogs e listas que, ao invés de simplesmente participar, corrigiu um enunciado! Algo que não tem importância alguma para a resposta, mas foi o suficiente para “mostrar que é bom bagarai”. Que mané “economia da doação: boa vontade é isso aí…
Em tempo, se você chegou até aqui e gostaria de participar de uma pesquisa extremamente relevante sobre o uso de blogs e a difusão de informações, ajude a professora Raquel Recuero, respondendo uma pesquisa rápida sobre o tema. Aproveite para indicar seus conhecidos: avise aqui ou entre lá e deixe um recado com seu e-mail. Quando os resultados forem devidamente tabulados, ela vai comentar tudo em seu blog.
Mas se for participar, faça espontaneamente e com aquele espírito bacana de colaboração, hein?
Sei que gasto um tempo danado vendo os blogs que gosto… mas gosto de perder esse tempo, embora nem sempre possa ou deva.
E gosto de manter meu bloguezinho aceso. Não sei o motivo, mas gosto.
Um camarada me diz que essa coisa de Gifty Economy é quase como uma espécie de comunismo virtual ou virtualizado… Mesmo que não seja isso, o fato é que esse ‘grande mistério’ sobre as redes colaborativas está queimando os miolos das empresas tradicionais de comunicação — e como! Antes era assim: tenho a informação, você tem o dinheiro; troquemos um pelo outro. Mas o ‘dois ponto zerismo’ fere essa lógica. Porque vou pagar a EFE por uma notícia sobre o Azerbajão se posso ler o que os jornalistas nativos de lá publicam gratuitamente em seus blogs? A sacanagem é quando não citam a fonte. Muitos jornalistas utilizam blogs como fonte mas não fazem qualquer menção a eles na hora de publicar…
Sobre o mundo acadêmico: nesse mundo inexiste Gift Economy ou Creative Commons. A academia é o território da vaidade cangaibana… (Quase) ninguém divide nada do que produz, e há os professores orientadores (seja de TCC, tese ou dissertação) que são campeões de se apropriar de conteúdo arbitrariamente, inserindo o nome deles em artigos nos quais não escreveram uma única linha. Não é só a ‘grande imprensa’ que tem de aprender com as redes colaborativas. A universidade está no mesmo barco, infelizmente.
Bem que eu estava achando estranho tu não ter respondido meu email. hahahahaha 🙂 De qualquer modo, a discussão é muito bem levantada. Daqui a pouco vou colocar um pouco da pesquisa e um pouco de outras pesquisas sobre motivações de blog lá no meu, daí a gente continua o papo. 🙂
Gifty Economy geralmente é uma parcela do objetivo. Blogueiro também quer reconhecimento, fama e dinheiro, não necessariamente nesta ordem.
Ótima discussão! 🙂
O problema é que sempre tem alguns que vão atrás de algo – fama, ou reputação – e, no fundo, para muitos, a colaboração acaba sendo não exatamente “para o bem de todos”, e sim principalmente para satisfazer o próprio ego :/
O blog só veio facilitar minha vida nesse ponto!
Sempre escrevi, antigamente mais poesia do que crônicas e afins… Mas o ponto é sempre escrevi…
O blog só facilita a forma de distribuição da informação. E deixa fácil de comentar tb!
Conheço muita gente que tem blog por conta da rede de relacionamento que se forma por meio desse meio. Eu, por exemplo, sou uma dessas pessoas, hehehehe…
Ps – A professora Raquel ainda precisa que se responda ao questionário? Como é que faço?
Prezado Marmota, não acredito que não conheci antes teu blog. Já deixei recado no blog da Raquel devido ao teu pedido. Gostei de como as coisas andam por aqui. Vou passar por aqui muitas outras vezes. Grande abraço!