Cinco dogmas do design que estão sendo derrubados

Sempre fico mais à vontade dando palpite em conteúdo, nunca na forma. Conheço muita gente gabaritada para dizer se tal site é bonito, claro, usável… Também fico feliz ao saber que muitos profissionais do ramo estão sendo devidamente valorizados, sempre derrubando os obstáculos que separam os usuários daqulo que eles realmente desejam. Mais do que isso: tal importância dada a pesquisas, testes e toda sorte de experiências praticamente “matou” a figura do webmaster, aquele sujeito (normalmente o “filho do dono”) que quase programava bem, quase desenhava bem, quase escrevia bem… E pensar que muitas empresas ainda contam com esse tipo de aberração para tocar seus projetos.

Mas enfim. Como tudo que envolve a Internet, a grande solução visual de hoje pode se tornar ultrapassada amanhã. Especialmente em grandes portais, onde há muita gente de olho na concorrência, as mudanças a favor do internauta são constantes – a ponto do navegador assíduo identificar alguns padrões, indicando uma clara inspiração mútua – ainda que cada um permaneça com sua identidade própria. Trocando em miúdos: “nossa, como ficou parecido com o site tal…”.

E aqui cabe um pitaco: ainda bem que nenhum portal brasileiro se “inspirou” no 20 Minutos, da Espanha, uma das piores homes do mundo.

O exemplo da semana é o G1, que lançou sua nova cara, sintonizada com a do portal. Não pude deixar de perceber uma série de detalhes semelhantes ao visual clean promivido pelo Estadão.com, que por sua vez redividiu suas editorias usando cores – como fazia a Folha Online. Aliás, as tonalidades diferentes separando notícias, esportes e entretenimento também inspiraram o Ig… O novo visual do G1 atiçou meus sentimentos nostálgicos. Fui buscar em meus alfarrábios algum “manual de design” antigo, atrás de algum capítulo repleto de “regras que precisam ser executadas”.

Encontrei a edição do livro Websites que Funcionam, publicado em 1997, do consagrado Roger Black, profissional que viveu uns trinta anos de carreira mídia impressa antes de desenhar para a Internet. Bom, é de autoria dele a identidade visual da pior fase da revista Placar, aquela do “futebol, sexo e Rock’n Roll”. Imaginava encontrar outros deslizes além desse, mas me surpreendi ao reencontrar definições ainda atuais, como ambientes colaborativos e controle total do usuário. Outra, emprestada do bom e velho Jakob Nielsen: “toda a indústria vai perceber que a Internet não tem nenhum significado sem boas histórias, bons personagens e uma boa direção. Conteúdo é rei”.

Ainda assim, consegui pinçar cinco “regras valiosas” que funcionavam há uns dez anos, mas totalmente rediscutidas.

#5 Não use todas as cores – Coincidentemente, as cores deste blog são as mesmas sugeridas Roger Black como sendo a “escolha infalível”: o trio branco, preto e vermelho resulta no melhor contraste possível. Bem diferente das combinações envolvendo verde-limão, azul-bebê, laranja-fosforescente… Analisando friamente, a lei da menor quantidade de cores, em busca de identidade e consistência visual (para não causar a impressão de “sites diferentes no mesmo”) é válida.

Não é preciso clicar muito para descobrir sites horrendos, verdadeiros carnavais psicodélicos. O abuso ainda é condenável. Mas boa parte dos sites noticiosos, acostumados a usar tons de azul (que denotam sobriedade) em conjunto com fundo branco e letras pretas, encontraram soluções muito interessantes ao dosar cores distintas para diferenciar editorias. Na home da Globo.com, esporte é verde, notícia é vermelho e entretenimento é amarelo. Já o UOL Esporte utiliza uma cor para cada modalidade relevante.

#4 Nada de atrasos – “Em um mundo de banda estreita, não há atraso aceitável”. Ah, os bons e velhos tempos em que uma foto grande carregava após quase um minuto de espera… Em 1997, projetar qualquer conteúdo considerando usuários com modem de 28.8 ou 56kbps era obrigação. Atualmente, já é possível dizer que essa preocupação sumiu. Só no Brasil, são 6,5 milhões de assinantes de banda larga (uns 20% do total de usuários). Estimativa que considero baixa. Quem costuma navegar no trabalho ou na lan house já consegue baixar fotos, filmes, programas…

Assim, já podemos dizer: conteúdo multimídia deixou de ser um problema. Mas há um desafio que não mudou em dez anos: ao invés de simplesmente reproduzir a mesma informação em todas as linguagens possíveis, por que não integrá-las em um único produto, concebido especialmente para a rede? É possível pinçar alguns bons exemplos (o Clarin faz muito disso), mas se a web já superou o obstáculo da banda larga, ainda estamos longe do dia em que o potencial multimídia será devidamente explorado.

#3 Use pouco texto – “A única pessoa que vai ler tudo que você escreve para a Internet é a sua mãe”, dizia Roger Black em 97. Ele não era o único: especialistas em usabilidade e webwriting empurravam fórmulas matemáticas para garantir a absorção total da sua mensagem: no máximo três blocos de texto, com cem palavras cada. Anotou? Pois tem muito designer que ainda se preocupa em “repartir” blocos de texto em uma porção de páginas…

Tenho que admitir: ler qualquer coisa na tela de um computador cansa. Além disso, temos tão pouco tempo para ler tudo aquilo que gostaríamos… Felizmente o usuário já pode contar com os leitores de feeds, que não só “descolam” o texto do layout, como também garante a leitura daquilo que realmente importa. Nesse contexto, é possível dizer que a “passadinha de olhos” não é a regra, mas sim a leitura em profundidade. Aliás, os dados preliminares da pesquisa Eyetrack, do Instituto Poynter, apontam essa tendência. Vamos escrever, pessoal!

#2 Sem rolagem! – Entre todos os itens, talvez este seja o mais sintomático. “75% dos usuários observam apenas a primeira parte da página”, dizia Roger Black. Havia uma preocupação absurda em impedir a barra de rolagem em qualquer página, graças a essa notícia triste. E eu me arrisco a dizer: os blogs contribuiram um bocado para que esse mito fosse derrubado. Já imaginou como seria um blog sem rolagem?

Vou tomar mais uma vez o exemplo do Clarin. Dê um clique ali, e mantenha a primeira página na aba padrão, a do “último momento”. Repare que os eventos mais importantes aparecem em ordem descrescente, com destaque para o horário de publicação. Como se fosse um blog. E usando uma senhora rolagem. Claro que a área superior continua sendo a mais nobre, com maior visibilidade… Mas responda com sinceridade: você realmente deixa de conferir o que está na parte de baixo?

#1 640 x 480 – “A maioria dos usuários utilizam monitores de 14”. Por isso pare de se enganar e projete seus sites para 640 x 480″. Essa sim é uma “regra de ouro” perfeita para dar risada. Até porque, a discussão sobre “qual resolução é melhor” vai muito além de uma simples escolha, tal como “ah, agora 800 x 600 é bem mais popular, não tem conversa”.

Talvez o primeiro grande site a investir em uma área útil maior, o 1024 x 768, foi a Folha Online, em maio de 2006. “O ganho permite incluir fotos maiores e adotar mais chamadas”, diz o texto explicativo. Faltou citar a valorizada monstruosa na área de anúncios… Mas enfim. Depois de um ano e meio, boa parte das métricas revela um aumento considerável no volume de navegadores ajustados em 1024 x 768 (algo como 60%).

Antes de perguntar aos amigos especialistas quantas besteiras eu cometi acima, vale uma sugestão de leitura mais abalizada: Design para a Internet, de Felipe Memória, o cidadão que prega a experiência perfeita dos usuários – para que todos “achem, usem, compartilhem e expandam o conhecimento”.

Ah, sim,, o Cleverson Braga já amplificou a discussão em seu recém-inaugurado blog. Vai lá ver!

André Marmota é professor universitário e ouvinte frequente da pergunta “mas e além disso, você também trabalha?”. Quer saber mais?

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Comentários em blogs: ainda existem? (7)

  1. Puxa, agora lembrei do Noronha que nem leu nada do conteúdo do Cintaliga só porque o blog tá em uma resolução que ele julga ultrapassada… 🙁

  2. Você foi o primeiro a saber da minha estória de vida. Não se subestime. Gostei deste post porque nem sei de tecnologia, porque sou n00b, mas sei que me amarro no Cintaliga e protestei o comentário do j.noronha. Minha queixa em relação ao Cintaliga é a ausência de assinatura via e-mail.

    Você, André, é da bomb!

  3. Licença, André.

    Tina, eu já disse pra você me explicar como fazer essa assinatura por mail, que aí providencio pra vc (e pros demais leitores do Cintaliga que quiserem).
    😉

  4. Danou-se marmota! concordo com o que esta escrito ai em cima por que simplesmente sou uma anta em internet, e como diz minha filha é um verdadeiro milagre quem não sabe nem mandar email como eu ter um blog.
    Mas gosto de blogs claros, me incomoda fundo escuro e letras claras, ou tudo preto.
    gosto de bons textos, bem escritos,não importa o tamanho, se for bom de ler…
    Um bjo.

  5. É isso. O que importa é o conteúdo 🙂
    Mas ainda acho que o G1 era melhor antes… O vermelho como cor predominante era forte e impactante.
    Incrível como alguma das regras de design para a web permancem eternamente atuais.

  6. Algumas dessas regrinhas eu tento seguir. Outras eu simplesmente ignoro. O bom é que a web-linguagem não é uma ciência exata, e o contrasenso de hoje pode-se tornar o paradigma de amanhã. Afinal, os sites mais populares do momento (Orkut e YouTube) vão na contra-mão de quase tudo o que já se escreveu sobre usabilidade.

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