É possível um mesmo espetáculo, com as mesmas letras, algumas piadas repetidas, praticamente a mesma estrutura… Enfim, alguma chance deste show permanecer em cartaz durante vinte anos, sempre com casa cheia?
E se a resposta for “sim”, resta outra dúvida: como se consegue essa proeza?
Hique Gomez e Nico Nicolaiewsky, gaúchos de Porto Alegre, estudavam violino juntos. O primeiro já era músico desde os 15 anos de idade – eram dez anos de profissionalismo quando conheceu o segundo, integrante do Grupo Musical Saracura, considerada um marco na música regional do Rio Grande do Sul.
Decidiram criar um show. Conceberam os personagens – Kraunus Sang e o maestro Pletskaya, vindos de uma ilha chamada Sbornia, que flutua pelo mundo após explosões nucleares mal-sucedidas. Vindas de suas lixeiras culturais, a dupla resgatou antigos sucessos de Vicente Celestino, Alvarenga e Ranchinho, Cláudio Levitan e até Paralamas do sucesso, reciclando tudo em forma de tango. Fizeram sua estréia em agosto de 1984, num bar em Porto Alegre.
Desde então, o espetáculo Tangos e Tragédias não parou mais. É considerado um dos maiores sucessos do teatro brasileiro, exportado para a América Latina, Portugal e Espanha. O que mantém Hique e Nico surpresos até hoje é o fato do Theatro São Pedro, na capital gaúcha, manter lotação esgotada todo mês de janeiro, época em que os portoalegrenses preferem ficar em Tramandaí, Capão da Canoa ou outra cidade badalada do litoral.
Uma das melhores definição do espetáculo foi proferida pelo meu ídolo Luís Fernando Veríssimo: “A Sbornia tem muito a ensinar ao Brasil, e não apenas o Copérnico, sua dança nacional. Eles expulsaram de lá os maestros Kraunus e Pletskaia, e o exemplo deveria ser seguido aqui, onde os dois anarquistas musicais, disfarçados de Hique Gomez e Nico Nicolaiewski, com seu Tangos e Tragédias, ameaçam nossos valores musicais, nossa compostura e nos matam de rir. Fora com eles!”
O mais incrível é que, em vinte anos, ainda tem gente que não assistiu ao espetáculo. Era o meu caso, até o último dia cinco, quando a dupla desembarcou em São Paulo para duas apresentações. Teatro lotado, claro. Inclusive por pessoas que, assim como eu, não conheciam o performático Copérnico, nem mesmo o coral popular durante a Aquarela da Sbornia – ninguém gritou “Bah” após o primeiro verso da canção.
Mesmo com gostinho de “inédito” para a maioria, isso não basta para explicar o sucesso de Tangos e Tragédias. Até porque, entre uma e outra canção recente – incluindo O Rappa, todos os sucessos de sempre estavam no show: o romance das caveiras, a verdadeira maionese, o drama de Angélica, a versão blues de trem das onze e a contagiante ana cristina. Sem falar na despedida: todos participam do espetáculo até a porta do teatro.
Tangos e Tragédias tem como pano de fundo o “lixo cultural reciclado”, mas fala em relacionamentos que não dão certo. Lamentações que todos temos vez ou outra, tragédias que se transformam em humor de primeira linha ao som de gaita e violino. Mesmo quem já sofreu por amor – ou quem já se sentiu ridículo por causa disso, se identifica inevitavelmente. E se diverte com a criatividade e o talento de Kraunus e Pletskaya.
Como diria Dona Milú, desta vez não tem mistério: Tangos e Tragédias tem tudo para comemorar mais vinte anos. E meu próximo passo é rever o show em pleno Theatro São Pedro. Vamos?
Oi André!
Bah… confesso que não sabia que a peça fazia tanto sucesso fora do RS também…
E confesso também que, mesmo tendo no mínimo uma apresentação por ano na minha cidade, ainda não vi…
Bom… se houver algum leitor do sul que mora perto de Novo Hamburgo, aviso: Tangos e Tragédias na Quinta, dia 16, às 21h, no Adams Street Hall.
É Marmota, o T&T é show mesmo. Eles vêm todos os anos pra Floripa e eu já fui duas vezes. É tudo isso que você falou e que o Veríssimo definiu lindamente!
Aliás, ambos têm seus trabalhos solos que são anunciados nos shows com o mesmo humor. Nós, aqui em casa, temos os dois e um deles, agora não me lembro qual, fez um medley maravilhoso com a música “Comida” dos Titãs! Vale à pena.
“Nós nascemos na sbornia, bah!”
Beijo, Elisa
Puxa, já ouvi falar mas nunca vi… Ai, deu uma vontade!!Lembrei do Vacalhau e Binho que tá em cartaz em SP há anos também. Abração!
Só vi o T&T na TV, num especial da TV Cultura… Tenho vontade de ver ao vivo, mas sou um purista: TEM QUE SER NO TEATRO SÃO PEDRO. Por conta disso é que amanhã, que tem apresentação deles em Novo Hamburgo, pode ser que eu não vá.
Cara, queria te agradecer de novo por tudo o que você fez naquele dia. É nessas horas que a gente vê a força de um amigo. Valeu, do fundo do coração.
Os caras são bons mesmo. E complementando a informação da Elisa, “Comida” está num disco solo do Nico Nicolaiewsky que é genial. Tem até uma outra canção que fala da agonia de ser um picolé no sol 😉
Ah poxa, eu fui no sábado. Se eu soubesse que irias… :/
Enfim, já perdi a conta de quantas vezes os vi. Sei cantar todas as músicas, hohohohoho… Adoro ANA CRISTINA e A VERDADEIRA MAIONESE.
Em Floripa, vi uma vez, um cover básico de MEU ERRO do Paralamas. Chorei. Lindo.
Beijo,