Minha única vez na BRA: tinha até piloto!

Viagens aéreas sempre rendem boas histórias, mesmo para aqueles que já se acostumaram com os saculejos das pontes aéreas. Não é o meu caso, evidentemente: voar, para mim, só a convite ou de Gol, que é mais baratinho.

Ou melhor, era. Até conhecer esta incrível empresa aérea, capaz de cobrar 129 reais pelo trecho entre São Paulo e Porto Alegre – apenas dez reais mais caro em relação ao ônibus, que leva dezessete horas a mais para percorrer o mesmo trecho… Não tive dúvidas: resolvi embarcar na BRA para experimentar. Foi a primeira e última vez.

O sofrimento começa com a compra da tal passagem. Nada de e-ticket, centrais informatizadas, entre outras inovações. Os caras funcionam via fone, fax e algumas cópias xerox de formulários. Uma papelada que tem como destino o escritório central, no centro velho de São Paulo. Pagamento com cartão? Mais um formulário. Tudo vai dentro do mesmo envelope, cujo destino é um malote – ou quem sabe um pombo correio. O fato é que, se num site de outra companhia você leva alguns minutos para acertar tudo, ali são algumas horas. No final, a passagem: um impresso tipo sulfite com os dados registrasdos na boa e velha HP jato de tinta. Eita!

Ah, mas pra andar de avião por 129 paus… Claro que qualquer sacrifício é válido! Até mesmo encarar as exigências pouco comuns em vôos regulares, mas fundamentais num vôo tipo “charter” como esse, algo como um fretamento – este é o pulo do gato. O preço é ótimo, mas para aproveitar a viagem, é preciso ligar um dia antes para confirmar sua presença e chegar com duas horas de antecedência ao check-in. Em caso de atraso, ou se for necessário mudar o dia, pode esquecer o dinheiro que pagou. Outro detalhe: o avião só sai do chão com, no mínimo, 60% dos passageiros a bordo.

“Ué, mas eu preciso sair daqui hoje! Ai se eu tiver que ficar em São Paulo”, diziam alguns desesperados na fila do check-in – fila mesmo, faltando exatamente duas horas antes do vôo. Vontade de gritar algo como “se quer ir hoje, paga mais caro e vai na outra”. Acho até que os funcionários da empresa dizem isso. Tudo bem: mais divertido é ouvir coisas como “será que tem janta? Devem servir só um café requentado, biscoito água e sal, e olhe lá…”.

E a sala de embarque, em Guarulhos? Fica quase no subsolo! Todo mundo amontoadinho aguardando a chamada, que é feita em tom solene: “é com muita satisfação que anunciamos a chegada do Boeing 737… “. Céus! Os caras comemoram quando o avião aparece! Nisso, os amontoadinhos se concentram na porta de embarque. Fila? Pra quê, se os assentos não são numerados? Já que todos podem escolher seus lugares, leva vantagem quem chega na frente. E aí… Quem segura os mal-educados?

Ah, mas por esse preço… Além disso, não fosse assim, o avião não sairia lotado daquele jeito. E é incrível como não sobra um lugar sequer no velho 737-300. “Devem ser aviões antigos da Varig, que foram emprestados”, pensei, já acomodado em minha poltrona. Ali começaram minhas surpresas: pontualidade, serviço de bordo – melhor que a “serragem com mel” da Gol! – e jornal grátis! Tudo bem que o periódico era o famigerado “Circuito do Forró”, simplesmente o maior exemplo de como não se deve fazer um jornal…

Depois de uma hora e meia, cheguei são e salvo a Porto Alegre. E a bagagem idem! Tudo bem, já passava da meia-noite – os horários da BRA não são lá os mais bacanas. Tanto que, na volta,no embarque foi às seis da manhã – valendo a tal história das duas horas de antecedência! Foi praticamente um replay da volta, só que com mais sono… E eu, uma pedra. Não apenas por ter que passar pelos mesmos percalços da ida, mas principalmente por ter que deixar a capital gaúcha… Ao menos agora já sabia: pude furar a fila sem constrangimentos! Sai fora, vovó!

Pra terminar: vôos “charteiros” como este servem não apenas para atender aos mais apertados financeiramente, mas principalmente estimular quem nunca andou nesse trem em toda sua vida, graças ao preço competitivo em relação ao ônibus. A BRA foi a primeira empresa nacional a ter vôos – nesse esquema meio regular, meio fretado – para cidades como Mossoró, Caruaru ou Juazeiro do Norte, para alegria de muita gente que decidiu morar no sudeste. Fica a torcida para que a anunciada reestruturação da Rotatur, parceira da BRA, não prejudique essa nova modalidade de vôos.

(Postado em 22/10/2003. No fim das contas, a BRA praticamente acabou, endividada, fazendo o que os atuais gestores da aviação civil já deviam ter feito há muito tempo.)

André Marmota acredita em um futuro com blogs atualizados, livros impressos, videolocadoras, amores sinceros, entre outros anacronismos. Quer saber mais?

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Comentários em blogs: ainda existem? (10)

  1. O engraçado é o nosso governo. Ontem de tarde estava rolando uma reunião no ministério da defesa e quando os ministros foram indagados sobre a queda da BRA, todos ficaram com cara de espanto,estava evidente que ninguém sabia do caso, agora entre tantas inutilidades do governo em questão de um Brasil sustentável e independente, fica a pergunta. Como será agora o esquema da aviação? eles fecharão as linhas? abrirão de vez? VÃO PRIVATIZAR??

  2. Já vai tarde… Voei para Brasília de BRA e, assim que retornei a São Paulo, coloquei na minha cabeça que jamais voltaria a pisar naquele avião. De fato, agora, não há mesmo chance disso acontecer, hehehe.

    O foda é que também não confio nem um pouco na GOL ou na TAM. A Varig faliu. O apagão aéreo segue comendo solto…

    Pensando bem, o melhor a se fazer no Brasil é pegar um ônibus no Tietê!

  3. Fala andré!!
    Espero que tenha ido bem de férias. O lanse é o seguinte: inexplicavelmente compramos os biilhetes da bra de Guarulhos a Porto Alegre e, apesar do horário desagradável e tal, não tivemos atrasos para embarcar (embora o avião tenha ficado parado uma hora porque não era autorizado a decolar) e o serviço de bordo foi satisfatório. Realmente, não posso dizer que tive um experiência ruim. O preço foi legal e acho que esse modelo pode, se bem administrado, funcionar.
    Graaande abraço!
    Marlon

  4. Alguns colegas meus foram de BRA para São Paulo no meio do ano… o vôo de retorno deles estava originalmente marcado para um dia antes do nosso, da Gol. Mas eles só chegaram a Porto Alegre 3 dias depois de nós 😛 (parece que nesse meio tempo eles chegaram a levantar vôo duas vezes, mas em ambas o avião teve que voltar para SP). 4 anos depois da data do post, e os mesmos problemas estruturais…

    De qualquer modo, o aviso de ontem no voebra.com.br chega a ser triste :~

  5. Minha única viagem de avião foi de Gol (ida e volta, Guarulhos – Porto Alegre ), graças ao preço: paguei 50 reais a ida e 50 reais a volta! Era mais barato ir de São Paulo pro Rio Grande do Sul de avião do que pra minha cidade em Minas Gerais de ônibus.

  6. Engraçado que vários defeitos da BRA são os mesmos da United Airlines. Detalhe: o vôo de Los Angeles para o Rio na época da Semana Santa, nosso ritual, tornou-se impraticável a mais de 1.700 dólares/ida e volta por pessoa.
    Duas horas antes, revista, aqui e no Galeão, aerovelhas de má vontade, em vez de burrocracia de papel, burrocracia eletrônica, mil avisos e confirmações.
    Só que o Brasil está muito caro para nós. 2010?

  7. Meu ex-namorado fez Belém-Manaus-Belém de BRA, por um preço incrível, absolutamente pontual, e sem nenhuma intempérie.

    Se todas fossem assim…

  8. Por tudo o que foi citado já passei. Com mais alguma coisa, pois como a BRA não tinha avião disponível, me deixaram na espera de uma vaga na TAM. Uma longa espera. Tivesse viajado de ônibus teria ganho tempo e dinheiro.

  9. achei muito triste a bra fechar, poistenho otimas lembranças. ja trabalei na saudosa bra e não tenho o que reclamar…pois amo esta empresa.

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