2010, o ano das mídias sociais nas eleições. Tem certeza?

Então chegou a hora de olhar para as páginas viradas do calendário e caminhar por trilhas percorridas durante 2010 – por exemplo, pela corrida presidencial. Uma consulta aos mecanismos de busca é suficiente para recuperar alguns títulos publicados sobre o tema, a começar pelo tom alvissareiro do primeiro semestre. “Este será o ano da web no marketing político do Brasil, e isto é um fato”; “as mídias sociais não serão desprezadas pelos políticos”; “a eleição de Obama coroa o uso das mídias sociais como ferramenta de comunicação”; “após sete anos de existência, as mídias sociais suplantam o uso de e-mail”…

A campanha se aproximou e o discurso transformador da Internet ficou mais ameno. “A maioria dos políticos brasileiros não sabe usar as ferramentas corretamente”; “o Twitter é um canal que convida para o debate, mas não permite seu aprofundamento”; “a Internet não será decisiva nestas eleições, e além disso não há como saber qual será sua influência”. Sabia-se que os partidos recrutaram cabos eleitorais para atuar nestes canais, mas pouco se sabia sobre as estratégias que seriam usadas.

Finalmente o pleito foi realizado, Dilma Rousseff foi eleita e as impressões prosseguiram. “Pessoas puderam se manifestar publicamente, tendo sua voz amplificada pelas mídias sociais”; “vimos uma reprodução de monólogos e poucas trocas construtivas”; “a superficialidade vista nas postagens vazias e panfletárias refletem nossa sociedade”; “a campanha foi pouco propositiva e os boatos foram constantes”. Ficamos com a sensação de que as conversas online ficaram restritas a aborto e bolinha de papel.

Esses três momentos absolutamente distintos, pinçados a partir de visões que consolidaram um senso comum, nos deixam sem qualquer conclusão. Afinal de contas, o que representou o uso das ferramentas em rede durante o processo eleitoral? Tivemos apenas boatos, atualização de agenda ou panfletagem eletrônica organizada pelos comitês eleitorais de cada candidato? Este foi o ano da web, da superficialidade questionável ou uma coisa não exclui a outra?

“Ih, mas as eleições ja foram, quem se importa com isso agora?”, poderia perguntar alguém. Enfim, se lembrarmos que, em 2008, já ouvíamos falar das “maravilhas das eleições 2.0”, e em dois anos permanecemos apenas com sensações e impressões a respeito, o convite para uma análise demorada e estruturada permanece. Não é tão simples formular estas respostas, mas se alguém pretende investigar o tema, considere explorar os dados obtidos pelo projeto NeoFluxo.

O Clayton Melo já apresentou a proposta no dia de seu lançamento, em novembro. Durante a reta final do primeiro turno e todo o segundo turno, o sistema construído pelo grupo de pesquisa Comunicação, Tecnologia e Cultura da Rede do Programa de Mestrado da Cásper Líbero coletou e armazenou em bancos de dados todas as postagens oficiais dos candidatos Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva em seus sites e nos perfis oficiais do Facebook, YouTube, Flickr e Twitter. Tivemos a impressão que Dilma usou seu Twitter para reforçar suas qualidades e bandeiras, enquanto o notívago Serra se concentrou em conversas informais. Com os dados do Neofluxo, é possível comprovar isso – ou descobrir outras apropriações.

Além disso, o sistema armazenou uma boa amostragem de menções no Twitter, relacionados a palavras-chaves determinadas pelos pesquisadores a partir do discurso do programa eleitoral da TV. É possível responder, portanto, até que ponto realmente houve um esforço para que o discurso oficial dos candidatos teve sintonia entre as plataformas.

Claro que nem todo mundo se interessa por estas análises a essa altura, afinal o ano novo pressupõe novos desafios e promessas que devem ser entregues no prazo que o cliente determinou. É preciso parar algum tempo para pensar no que estamos fazendo, e nesse sentido o Neofluxo deixou sua contribuição inicial. Uma das resoluções do grupo de pesquisa Teccred para 2011 é convidar programadores, comunicadores e outros interessados para um “hackday” a partir destes dados.

Se ao menos algumas respostas abalizadas surgirem a partir desta oportunidade, ficará mais fácil pensarmos num próspero ano novo.

(Publicado originalmente no IDGNow)

André Marmota acredita em um futuro com blogs atualizados, livros impressos, videolocadoras, amores sinceros, entre outros anacronismos. Quer saber mais?

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